Uma intervenção memorável

Com Jean-Claude Beaudoin, Idália e Odete no dia do naufrágio. Fotógrafo: Jean-Martin Rabot

A estação das homenagens acabou. Terça, dia 29 de novembro, foi uma festa. No ambiente acolhedor do museu D. Diogo de Sousa, foram sábios e generosos os testemunhos dos colegas e amigos, inspiradas e alegres as danças do Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Melgaço, virtuosa e tocante a guitarra do Francisco Berény Domingues, franco e caloroso o público, cuidado e oportuno o lançamento do livro Sociologia do Imaginário e reparador o alvarinho de honra. Ritual, a “lição” lembrou vagamente as antigas aulas.

No dia 8 de novembro, por ocasião do 46º aniversário, o Instituto de Ciências Sociais entendeu dedicar-me um momento de “despedida”. Coube a apresentação, inspirada e eloquente, ao colega e amigo Jean-Martin Rabot. Excessivo no elogio, introduziu um momento inesquecível temperado por um humor inconfundível e desconcertante. Somos os membros mais antigos do Departamento de Sociologia. Um par de decanos que partilhou experiências inenarráveis.

Jovens, aproveitamos as férias de Natal para nos deslocar, eu a Paris e ele a Estrasburgo, no carro, um “dois cavalos”, do Jean-Claude Beaudoin, então leitor de francês na Universidade do Minho. Nevava. Nevou, aliás, toda a viagem. Ainda em Trás-os-Montes, uma roda danificou-se num buraco. Tivemos que ir concertá-la a Montalegre. Retomada a estrada, o limpa para brisas regulava-se pelo acelerador: ora mais depressa, ora mais devagar, consoante a velocidade. A neve só desapareceu, com o piso salgado, quando entrámos em França. E assim peregrinámos gelados durante um dia e uma noite. Chegados a Paris, o Jean-Claude Beaudouin perguntou como seria o reencontro para o regresso. Ambos respondemos: “Se não te importas, vamos de comboio”.

Outra vez, estava a jogar matrecos na esplanada do café da minha freguesia, Prado, em Melgaço. Sou um aficionado. No comércio da família, tínhamos matrecos. Em criança, colocavam-me em cima de uma caixa de madeira para jogar. Eis que, ao longe, surgem duas pessoas molhadas da cabeça aos pés, com colete salva-vidas e um remo na mão. Aproximam-se… O Jean-Martin Rabot e o Jean-Claude Beaudoin! Tinham ido estrear o caiaque do Jean-Claude no rio Minho que desastradamente perderam num dos troços que são, agora, atração do rafting. “Malucos, diz um velho, eles não sabiam que o rio tem correntes e remoinhos perigosíssimos!”. Pelos vistos, não. Tiveram a coragem dos ignorantes e a sorte dos inocentes.

Segue, com cumplicidade e gratidão, a intervenção do Jean-Martin Rabot.

Jean Martin Rabot. Apresentação de Albertino Gonçalves. Instituto de Ciências Sociais, 8 de novembro de 2022

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