Archive | Janeiro 2012

Excentricidades

Designer gráfico, fotógrafo, diretor artístico, realizador, Jean-Paul Goude é um dos grandes nomes da publicidade francesa das últimas três décadas. O Musée des Arts Décoratifs, no Palácio do Louvre, em Paris, acolhe, até 18 de Março de 2012, uma retrospectiva impressionante da sua obra. Segue uma amostra com alguns cartazes e fotografias, bem como um vídeo relativo à sua carreira (excertos do vídeo “Jean-Paul Goude: So Far, So Goude”). Uma seleção de anúncios para tv fica para um próximo artigo.

Um mundo de eventos

“Estamos vivendo a década do esporte, vamos fazer do Brasil o País dos nossos sonhos”. E nós estamos vivendo o ano das capitais europeias, vamos acordar Portugal. O mundial de futebol (2014) e os jogos olímpicos (2016) que o Brasil acolhe são apenas as duas competições desportivas mais importantes do planeta. Mas nós temos eventos todos os dias! Falando sério, o anúncio Dreams é primoroso: tem imagem, tem enquadramento, tem ritmo e não sai da cidade (ver vídeo 1). Em Guimarães, nem sequer se sai de casa para ouvir boa música. Fiquei surpreendido e orgulhoso ao ver alunos a tocar violoncelo no primeiro concerto da CEC 2012, no âmbito do projecto “Mi casa es tu casa” (ver vídeo 2).

Marca: Olympikus. Título: Dreams. Agência: Dcs Paranoid. Direção: Carlos Manga Jr. Brasil, Janeiro 2012.

Mi casa es tu casa

GMRTV. Casa na Quintã recebeu 1º concerto da CEC 2012. 28.01.2012.

Amigos da escuridão

”É errado dizer: Eu penso: dever-se-ia dizer: sou pensado – Perdão pelo jogo de palavras – Eu é um outro”. Assim escrevia Arthur Rimbaud em 1871. Somos bipolares, plurais, mutantes, camaleónicos, caleidoscópicos… Em suma, “eu sou vários”. Não somos feitos de uma peça só, não somos clarins, nem violinos. Sabemos isso há muito tempo. Basta ler as “Metamorfoses” de Ovídio, contemporâneo de Cristo. Não foi preciso esperar por Bakhtin, Goffman, Strauss, Bauman ou Deleuze. Duas figuras trágicas assombram, especialmente, o nosso imaginário: o lobisomem e o vampiro, ambos (nem) bestiais e (nem) humanos. O seu rastro no cinema é obsessivo: há dezenas de filmes com o lobisomem e o Drácula de Tod Browning data de 1931. Vem este arrazoado inútil a propósito do novo anúncio da Audi em que o carro assume o papel de um implacável exterminador de vampiros incautos. Bestial! Mas ecologicamente inconveniente. Importa proteger as espécies amigas da escuridão. Importa proteger-nos. Dostiévski, Baudelaire, Rimbaud, Wilde, Kafka agradecem.

Marca: Audi. Título: Vampire Party. EUA, Janeiro 2012.

Dança virtual

Black Sun é uma coreografia com projeção gráfica dos kagemu (Nobuyuki Hanabusa e Katsumi Sakakura). Os Kagemu bem podiam visitar este Minho bicapital: tradição e modernidade; artes do palco, gráficas e digitais; preto e branco…

Infelicidades verbais (ComUM, 28.01.12)

“Por um punhado de dólares” e “Quem atira a última pedra?” são dois textos de uma crónica, publicada no jornal online ComUm, sobre os deslizes mediáticos recentes de algumas figuras públicas (Aníbal Cavaco Silva, Pedro Passos Coelho e José Sócrates). Mas o enfoque incide menos nestas eventuais “insensibilidades” e mais no teor das reacções que suscitaram. Trata-se de uma crónica que rema contra a corrente num barco ideologicamente indigesto. Para aceder, carregar na imagem ou no seguinte endereço: http://comumonline.com/opiniao/item/577-infelicidades-verbais.

Infelicidades verbais. Crónica do ComUM. 28.01.12

 

A insofismável leveza do tacto

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Paula Rego.

Não devia partilhar este anúncio! O insólito aveludado, mesmo reduzido ao mínimo, tem um efeito máximo. É antigo, ao jeito do vinho do Porto, com um humor de outras eras, enrugado e frutado, sem buttox. Raro, muito raro, este anúncio escapou, não se sabe como, à censura. Encalhou, há anos, nesta página e dela não vai sair. Um sorriso subtil fica sempre bem em qualquer lugar. Se tem menos de 16 anos ou humor de plástico, p.f., abstenha-se: não clique.

Marca: Roge Cavailles Intimea Soap Wash. Título: The Painting. Agência: Grey Paris. Direção: Jean-Baptiste Leonetti. França, 2002.

A Decomposição da Música

Quando um anúncio publicitário aposta na música, o resultado costuma ser compensador. E quando o faz num registo barroco, o efeito tende a ser deslumbrante. Este anúncio da Sony, Music Pieces, arrecadou mais de uma dezena de prémios internacionais. Cada um dos 128 músicos toca apenas uma única nota. Enjoy it!

Marca: Sony Walkman. Título: Music Pieces. Agência: Fallon London. Direção: Nick Gordon. Reino Unido, Outubro 2007.

As manhas da observação

Whodunnit é um anúncio de prevenção rodoviária deveras original e brilhante. O desafio consiste em descobrir o assassino. Graças à capacidade de observação, lamentavelmente, muito limitada. O que costuma ser péssimo para a justiça e óptimo para o assassino.

Anunciante: Transport for London. Título: Test Your Awareness, Whodunnit. Agência: WCRS. Direção: Chris Palmer. Reino Unido, 2008.

A língua dos clones e a língua de Camões

O mundo da imaginação está cada vez mais povoado por clones. E o mundo dos clones, muito limitado na sua perfeição singular, está cada vez mais dominado pelo monoteísmo da língua única. Já aprendemos, em português, que para aceder à inteligência convinha falar inglês. Segundo este anúncio, com o sexo acontece o mesmo. Esta exclusão não teria, certamente, ocorrido no tempo de Luís de Camões e da Ilha dos Amores: “Impossibilidades não façais / Que quem quis sempre pôde: e numerados / Sereis entre os heróis esclarecidos / E nesta Ilha de Vénus recebidos” (Os Lusíadas, canto IX, estrofe 95), sabendo que o que Vénus proporciona “Melhor é experimentá-lo que julgá-lo / Mal julgue-o quem não pode experimentá-lo” (Os Lusíadas, canto IX, estrofe 83).

Marca: Ccaa. Título: Megan ou Mike. Brasil, Janeiro 2012.

“Às vezes uma história bem contada vale tanto quanto uma oração”

A associação brasileira Viva e Deixe Viver assegura a formação de voluntários que se dedicam a contar histórias a crianças e adolescentes internados em hospitais. Uma das suas campanhas assume o seguinte lema: “Às vezes uma história bem contada vale tanto quanto uma oração”. Seguem dois cartazes, um com o Capuchinho Vermelho e o outro com Peter Pan.

Se a Associação Viva e Deixe Viver sugere que as histórias bem contadas tocam no céu, a editora brasileira de livros para crianças Sabugosa lançou uma campanha para mostrar que as grandes histórias são intemporais: “As grandes histórias vivem para sempre”. Os cartazes mostram o Capuchinho Vermelho, o lobo, o Pinóquio e o grilo falante envelhecidos. Como foi assinalado por vários comentadores, sobrevem nesta campanha um problema de interpretação: as grandes histórias vivem para sempre ou envelhecem, tendo o seu tempo passado?