Barbas salutares
A Modernidade abraçou a Razão. O ser humano passa a orientar-se e mobilizar-se pela análise, pela linearidade e pela lógica. Eis uma das maiores ilusões da História da Humanidade. Segundo Marshal McLuhan (A Aldeia Global, 1992), o cérebro divide-se em dois hemisférios: o esquerdo, visual, mais racional e o direito, acústico, mais emocional. Na Modernidade, prevalece o lado esquerdo.

Vem esta nota a propósito do anúncio de sensibilização norte-americano A Hairy Time. Enquanto que no Oriente, a publicidade de sensibilização não hesita em recorrer à fantasia e ao absurdo, no Ocidente insiste-se na argumentação lógica e racional. Mesmo que o insucesso seja, muitas vezes, o preço deste arremedo de seriedade. A motivação e a adesão das pessoas continuam a assentar, em grande medida, num fundo não racional (Max Weber) e não lógico (Vilfredo Pareto).
A Hairy Time oferece-se, portanto, como uma pequena exceção: a delicadeza e gravidade do tema (a vacinação) não dispensam nem a excentricidade nem o sentido de humor.
Rescaldo, Van Gogh e Quartier Latin

O monte de Santa Tecla esteve em chamas. Ainda paira algum fumo. Consola-me um pequeno filme de animação dedicado ao Van Gogh da autoria do iraniano Alireza Karimi Moghadam que o Eduardo Pires de Oliveira teve a inspiração de me enviar. Revejo-o, volto a fazê-lo, e, nesta esquina à beira Minho, deixo-me embalar pelas memórias dos anos de estudante.

Recordo professores como Louis-Vincent Thomas ou Raphael Pividal e colegas como o colombiano Marino Trancoso, jesuíta companheiro de ousadias (falecido, atribuíram o seu nome a um dos principais auditórios da Pontificia Universidad Javeriana, de Bogotá) ou o sérvio Duško Lopandić, em cuja casa, em Tuzla, me atardei uma semana (foi ministro adjunto do governo sérvio e embaixador da Sérvia em Portugal e Cabo Verde, de 2007 a 2011). No que me concerne, regressei à terrinha há mais de quarenta anos. Melgaço e Moledo valem o desvio!
Ce quartier qui résonne dans ma tête
Ce passé qui me sonne et me guette (…)
Les années, ça dépasse comme une ombre (…)
Je r’trouv’ plus rien, tell’ment c’est loin, l’Quartier latin
Este bairro que ecoa na minha cabeça
Este passado que me toca e me espreita (…)
Os anos (ultra)passam como uma sombra (…)
Já não reencontro nada, tão distante está o Quartier Latin.




Sentido de oportunidade
En Galicia hai 120 concellos con máis vacas que persoas. Se as vacas votasen, teriamos moito “ganado” (Leyma)
Ontem, 25 de julho, foi o Dia da Pátria Galega. A empresa de laticínios Leyma aproveitou várias frentes: o povo galego, as eleições e a ecologia. A Diana Gonçalves, que me enviou o anúncio, acompanha-o com o seguinte comentário:
Onte e como todos os anos, no día de Galiza, os xornais recollen mensaxes institucionais (…) e a publicidade das grandes marcas feitas para a ocasión, que por intereses comerciais, lles convén amosar a súa galeguidade. A de Leyma (grupo leiteiro) pareceume axeitada, tendo en conta non só as circunstancias como o calendario (Diana Gonçalves).

Frango Astronauta

A CP [Charoen Pokphand Group] vai entregar carne de frango à International Space Station (ISS) através da SpaceX Dragon
Anúncio tailandês hilariante. Uma alucinação exorbitante ao jeito oriental. Bom proveito!
Relaxar a eito! A maçã e a abóbora

Tinha saudades de um anúncio como este. Lacónico e inspirado, torna o pouco bastante e o inexpressivo eloquente. Imagem, música, duração e ritmo dão primorosa e discretamente as mãos. Ao arrepio da tendência pós-Covid, não aposta na oralidade, na conversa. Opção que não compromete a mensagem. Tudo fala pelos cotovelos, até a lentidão e o tédio, aparentemente assumidos como privilégios.
Autocarros diretos entre Melgaço e Paris no início dos anos sessenta
O Valter Alves não se cansa de desencantar documentos raros e preciosos sobre Melgaço nas mais diversas fontes possíveis e imagináveis. Assim vai crescendo, para nossa instrução, o blogue Melgaço, entre o Minho e a Serra, com mais de 5 000 artigos (https://www.facebook.com/hashtag/melga%C3%A7oentreominhoeaserra).Hoje, 20 de julho de 2023, publicou uma cópia de um anúncio no jornal A Voz de Melgaço de 1962 com as carreiras de Melgaço a Paris.

Recordou-me um outro anúncio publicado dois anos antes no jornal Notícias de Melgaço a divulgar a inauguração de “auto-carros Explêndidos e Luxuosos a saírem de Puente Barjas directos a Paris”.

Em Melgaço, a emigração para França foi das mais intensas e precoces de todo o país. Se já se emigrava para França antes da guerra, nos anos cinquenta este movimento atingiu já dimensões consideráveis. Mais do que as estatísticas oficiais, atestam-no vários indicadores indirectos como, por exemplo, os ecos que a seu respeito se fizeram sentir na imprensa local. No Notícias de Melgaço, o espaço concedido à emigração vai crescendo ao longo dos anos cinquenta ao ponto de, entre 1955 e 1960, ocupar, amíude, cerca de metade da superfície total do jornal. São artigos sobre as partidas, as chegadas e as férias dos emigrantes, sobre os seus convívios e as visitas de personalidades da terra à “colónia melgacense (…) espalhada por França”, sobre o transporte para o estrangeiro, os dilemas e dramas da emigração clandestina e sobre muitos outros assuntos esparsos entremeados com apelos ao seu auxílio para iniciativas locais. Abundam, sobretudo, os artigos publicados regularmente sob várias rúbricas tais como “saudades”, “cartas de longe”, “postal para longe”, “carta para França”, “carta da França” ou “aqui França”. Entre 1957 e 1958, nas listas publicadas com os donativos para a elaboração do projecto de estrada para Fiães, as dádivas em francos ou provenientes do estrangeiro surgiam em maioria. E em Janeiro de 1960 aparece, em primeira página, um elucidativo anúncio de um “auto-carro” directo a Paris com saída do outro lado da fronteira bem junto a Melgaço (Gonçalves, Albertino, Imagens e Clivagens: Os Residentes face aos Emigrantes, Porto, Edições Afrontamento, 1996, p. 76).
Vestida de mar
Uma amiga de Melgaço acaba de me enviar de uma assentada três músicas que não resisto a partilhar.
Emilio Cao. A voz e a harpa

A harpa integra os instrumentos da música dita celta. Encontramo-la na Galiza, na Bretanha, na Cornualha, no País de Gales, na Irlanda e na Escócia. Curiosamente, não aparece como característica do Minho, apesar das raízes celtas. Cada um destes territórios possui harpistas célebres, por exemplo, o bretão Alan Stivell, o irlandês Derek Bell (dos Chieftains), a escocesa Phamie Gow, a galesa Catrin Finch ou o galego Emilio Cao.
“Emilio Cao (Santiago de Compostela, 1953) es un músico, compositor y cantautor de música folk y tradicional gallega. Destacado intérprete de arpa celta y recuperador de este instrumento medieval en Galicia” (https://es.wikipedia.org/wiki/Emilio_Cao).
Atuou, com o português Fausto, nos Encontros Culturais I de Castro Laboreiro, em 1986, a 15 de agosto, dia da feira do gado e do concurso do cão de Castro Laboreiro. Contemplando vários eventos associados a tradições locais, tratou-se de uma iniciativa, ousada, protagonizada por um grupo de jovens. Repete-se uma tendência: o empenho dos filhos e dos netos na valorização e na revitalização do património, dos usos e costumes, dos avós e dos pais.
Seguem quatro canções de Emilio Cao.