Asas com rodas
Gostamos de asas. Basta escrever a palavra para a frase ficar mais leve. Gostamos também de passarinhos. E dos pobrezinhos. “Pobres dos pobres são pobrezinhos, almas sem lares, aves sem ninho…” (Guerra Junqueiro, Os Pobrezinhos, Os Simples). Mas “de quem eu gosto, nem às paredes o confesso” (Amália Rodrigues). Se calhar, do Leonard Cohen… “Oh like a bird on the wire / Like a drunk in a midnight choir / I have tried in my way to be free” (Bird on the Wire, Songs from a Room, 1969). Pelos vistos, ainda não perdi a mão à “difícil arte de cavalgar” (Dom Duarte) uma citação por linha.
Marca: Volkswagen. Título: Wings. Agência: Argonaut. USA, Janeiro, 2014.
(“Bird on the Wire” from Songs from the Road by Leonard Cohen)
O Inferno do Belo
“Somente diremos aqui que, como objectivo junto do sublime, como meio de contraste, o grotesco é, segundo nossa opinião, a mais rica fonte que a natureza pode abrir à arte (…) O sublime sobre o sublime dificilmente produz um contraste, e tem-se necessidade de descansar de tudo, até do belo.” Assim escreve Victor Hugo em 1827 (Do Grotesco e do Sublime, São Paulo, Ed. Perspectiva, 2002, p. 31).
Duas décadas mais tarde, em 1853, Karl Rosenkranz escreve:
“O inferno não é apenas religioso ou ético, é também um inferno estético. O mal, o malvado rodeiam-nos, tal como o feio. Os horrores de informe e do disforme, da mesquinhez e da repugnância cercam-nos sob inúmeros aspectos, desde os rebentos liliputianos até às monstruosidades gigantescas, onde a maldade infernal nos olha fazendo caretas e rangendo os dentes. É a este inferno do belo que queremos descer” (Esthétique du laid, Paris, Circé, 2004, p. 41).
Segundo Victor Hugo, “O génio moderno (…) transforma os gigantes em anões; dos ciclopes faz os gnomos” (Ibidem, p. 32). Pois, porque não transformar um rikishi (lutador de sumo) numa espécie de bailarino contemporâneo?
Marca: Mobel Kraft. Título: Table. Agência: Lawinenstift. Alemanha, Janeiro 2004.
Eis um artigo com ares de preguiça. Meia dúzia de palavras. Se alguma ideia se perfila pertence a outros. Tem duas citações. São duas pérolas? Coisa ínfima, sobretudo, quando está em voga a contagem de citações pelos capatazes da ciência. Como o escravo de César, o trabalho para o ser tem que o parecer. Como diria o Marquês de Portfolio, trabalho que não se vê é trabalho que não existe. Quem não se entrega ao acabamento das aparências é um preguiçoso. Pimba! Assim escrevo eu em 2014.
Destapar o sol!
Com tanta nuvem taciturna, dava jeito destapar o sol. Quem se candidata a subir a uma escada tão alta como o défice para afastar as nuvens? E, já agora, com mais um ou dois degraus não daria para destapar o futuro? Coitado, parece uma ostra sem pérola! Em contrapartida, este anúncio é soalheiro e optimista, a condizer com a “fábrica da felicidade”.
Cliente: Coca-Cola. Título: Cielo. Agência: Young & Rubicam. Direção: Pucho Mentasti, Watta Fernandez. Argentina, 2009.
Uma questão de estilo
Este Sapeurs, da Guinness, é um anúncio espantoso. Treme no momento e no ponto certo para nos fazer vibrar. Em sociologia, a distinção entre status, classe e partido, proposta por Max Weber, é particularmente difícil de discernir. Os Sapeurs do Congo constituem um bom exemplo daquilo que é um grupo de status: “Their life is not defined by occupation or wealth, but by respect, a moral code and an inspirational display of flair and creativity. This is demonstrated through their love of stylish dressing; but it is not the fabric or cost of the suit that counts, it is the worth of the man inside it”.
Marca: Guinness. Título: Sapeurs. Agência: AMV BBDO, London. Direção: Nicolai Fglsig. UK, Janeiro 2014.
A Cadeia do Bem
Quando o Estado Social definha, alguém o substitui? A iniciativa privada?Quem acompanha os anúncios publicitários não tem dúvidas. Um dia virá em que pagaremos as esmolas! Compra o produto certo e abres uma sucursal do paraíso na terra e um par de asas no céu. Se escolheres outro produto, és um pecador insensato que desencadeia as labaredas infernais da gasolina e do gás. Enquanto o Estado se comporta como um Santo Antão atormentado pelos mafarricos, o capital assume-se como uma reencarnação de São Mateus. Na publicidade, este esquema parece estar a dar bons resultados.
Estes anúncios da campanha The Chain of Good, da Innocent Smothie, estão bem concebidos. Com ares de Flower Power, oferecem-se leves, lestos, divertidos e assertivos, com uma ponta de ironia que faz a diferença.
Marca: Innocent Smoothies. Título: The Chain of Good – Peru. Agência: 101. Direção: Max Joseph. UK, Janeiro 2014.
Marca: Innocent Smoothies. Título: The Chain of Good – Uganda. Agência: 101. Direção: Max Joseph. UK, Janeiro 2014.
Gostar não basta!
Há cerca de um ano, um artigo intitulado “generosidade virtual” apresentava um anúncio da UNESCO a alertar para a inoperância dos “like” em matéria de ajuda humanitária (http://tendimag.com/2013/04/24/generosidade-virtual/). Recordo, agora, uma campanha semelhante lançada, em Junho de 2013, pela CRS (Crisis Relief Singapore), em Singapura. Apesar da diferença de possibilidades, a fotografia preserva virtudes que escapam ao vídeo. Excelente publicidade de consciencialização.