Banquete de cinzas
Os nossos olhos, tão massajados por imagens, pouco ou nada os espanta. Aprecio, por isso, um vídeo que surpreende. Este anúncio da Action Contre la Faim (ACF) conduz-nos por atalhos estéticos até onde menos esperamos.
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Anunciante: United Nations / Action Contre la Faim. Título: The Feast. Agência: Publicis Conseil Paris. Direcção: Josh Dawson. França, Novembro 2015.
A Besta Humana
“Mais les bêtes sauvages restent des bêtes sauvages, et on aura beau inventer des mécaniques meilleures encore, il y aura quand même des bêtes sauvages dessous” (Emile Zola, La Bête Humaine, 1980).
A PeTA (People for Ethical Treatment of Animals) não é nada meiga com quem moleste os animais. Em termos de publicidade de consciencialização, as suas campanhas destacam-se como o protótipo da contundência. Introduzindo a voz de Sia, este vídeo retoma o anúncio de 2013 (Runway Reversal: http://tendimag.com/2013/02/13/humor-negro-e-humor-colorido/), mantendo o procedimento de inversão de papéis entre humanos e animais: por uma vez, é o corpo humano que veste os animais. A estilização é tão fantástica e surrealista, para não dizer maneirista, que temo que alguma informação se perca por entre ruídos e efeitos.
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Anunciante: PeTA. Título: Sia Wants to “Free the Animal. Agência: Ogilvy & Mather China. Direcção: Rain Yu. China, Novembro 2015.
Com o universo na mão
“Este pensamento – a infinitude do Universo – implica não sei que horror secreto; de facto, encontramo-nos errantes no meio desta imensidade a que recusamos qualquer limite, qualquer centro, ou seja, qualquer lugar determinado” (Kepler, Astronomia Nova… De Motibus Stellae Martis, 1609).
Creio ter percebido, enfim, a mensagem de um anúncio: o iPad Pro é uma estrela, com o universo infinito como limite. Com um iPad Pro, temos o universo na mão: “There’s a great big universe in the new iPad Pro. It’s the largest iPad ever and takes your creativity and productivity to an epic scale”. Uma escala épica… Um vídeo de belo efeito. As imagens do universo fascinam-nos de um modo quase religioso.
Marca: iPad. Título: A Great Big Universe. Estados Unidos, Dezembro 2015.
A alcoviteira electrónica
A campanha do novo Guerra das Estrelas é notável. A HP, por exemplo, lança produtos e multiplica os anúncios alusivos ao filme. Este Reinvent Romance with R2-D2 é simples, criativo e cirúrgico. O pequeno e dedicado robot, anjo de lata com rodas, assume o papel de alcoviteira. Dele para ela, com resultados desejados. Mais um passo na relação entre homens e máquinas.
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Marca: HP. Título: DYU / Reinvent Romance with R2-D2. Agência: BBDO New York. Direcção: Tom Tagholm. Estados Unidos, Novembro 2015.
Moda, sexo e violência
Moda, sexo e violência. Depois da Benetton e da Agent Provocateur, a Coach. Nem o Pai Natal escapa. A moda não se coíbe de maltratar os símbolos. Não fosse a moda o “império do efémero” avesso à tradição, a modos como uma tradição de mudança (Gilles Lipovetsky).
Marca: Coach. Título: A Holiday Film by Coach. Agência: Droga5. Estados Unidos, Novembro 2015.
Chá dançante
Quando cismo com uma ideia, sou maçador. Será que o chá também pode inspirar anúncios marcados pela leveza e pela turbulência? Repare-se na máquina de chá Lipton, com a participação do Cirque du Soleil! E o chá Kusmi! Nada, porém, que a Água das Pedras ou a Expo 98 não tenham borbulhado…
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Marca: T.O Lipton. Título: Cirque du Soleil / Revolution des saveurs. Agência: Adam&Eve DDB London. Direcção: Saam Farahmand. Reino Unido, Novembro 2015.
Marca: Kusmi Tea. Título: La Beauté des Mélanges. Agência : Quai des Orfèvres. Direcção: Robert Cohen. Janeiro 2014.
Marca: Água das Pedras. Título: Mergulha. Agência: Euro RSCG. Direcção: Augusto Fraga. Portugal, 2012.
Surf motorizado
Misturar alhos com bugalhos em caldeirão grotesco e revolver com uma colher formista, eis a minha tentação, inspirada, por sinal, em Heinrich Wolfflin, Erwin Panofsky, Georg Simmel e Mikhail Bakhtin.

Max Ernst. Pleiades. 1920.
O binómio leveza/turbulência não se confina à arte (junto, mesmo assim, algumas obras de Max Ernst). Hoje, proponho um atalho pelo desporto. As modalidades desportivas de equilíbrio e deslize constam entre aquelas que mais cresceram nas últimas décadas: surf, asa delta, parapente, bodyboard, esqui, skate, patinagem. Destacam-se como as mais características do nosso tempo. Atente-se, por exemplo, no surf e na asa delta. São actividades de movimento, equilíbrio, destreza, leveza e deslize; o surf, na turbulência das ondas, a asa delta, na turbulência do ar. Pertencem, segundo Roger Caillois, à categoria Ilinx (busca da vertigem).
Nada como os anúncios a automóveis para ilustrar estes atributos. Fui ao arquivo desencantar duas relíquias: um anúncio do Opel Astra, que creio ser de 2006, e um anúncio da Citroen, de 2007. Carregar em HD.
Marca: Citroen C3. Título: Dolphins. Agência: Euro RSCG London. Direcção criativa: Justin Hooper. Reino Unido, 2007.
Leveza e turbulência: obras de Max Ernst.
Somos bestiais
E, arremessando a Bíblia, o velho abade
Murmurou:
“Há mais fé e há mais verdade,
Há mais Deus concerteza
Nos cardos secos dum rochedo nu
Que nessa Bíblia antiga Ó Natureza,
A única Bíblia verdadeira és tu!…”
(Guerra Junqueiro, A Velhice do Padre Eterno. Poema: O Melro)
Mais um vídeo focado, com humor, nas semelhanças entre os seres humanos e os animais. Assenta no lema: não basta empenhar-se em criar a vida, importa protegê-la! Aprender a “ouvir a natureza” (Victor Hugo).
Para visionar o anúncio, carregar na imagem ou no seguinte endereço: https://www.youtube.com/watch?v=Q8GtYrf9Sz0.
Francisco de Goya. Leveza e Turbulência
“A estupidez é um peso no espírito que carregamos connosco nas acções e nos discursos” (Blaise Pascal).
Leveza e turbulência, eis uma associação que sempre acompanhou a humanidade. Neste capítulo, a reivindicação de originalidade aproxima-se da sublimação da ignorância. Somos biliões de seres humanos e temos centenas de milhares de anos. Tanta gente criativa! Aspirar a uma ideia original é como procurar uma agulha num palheiro e enfiar-lhe, em seguida, um camelo pelo fundo. Como diria Pascal, demasiada inteligência estupidifica.

Goya. Bruxas no ar. 1797-8.
A leveza e a turbulência estão patentes nos frescos de Pompeia e da Domus Aurea, nas esculturas e nas iluminuras medievais, nos tormentos dos juízos finais, nas artes da bruxaria, nas pinturas de Hieronymus Bosch, Pieter Bruegel, Jacques Callot, Francisco Goya, Marc Chagall ou Max Ernst.

Goya. Folly of the Bulls, circa 1815.
A originalidade plagiada exalta pequenos e grandes “mestres pensadores”. Convém, no entanto, não invocar o nome da originalidade em vão! Nem sequer a tirada de Isaac Newton convence: “se vi mais longe foi por estar de pé sobre ombros de gigantes”. Gigantes, só nos contos de fadas, nos filmes e nos videojogos. Só não somos anões porque nos fizeram aos saltos. Importa pagar tributo aos credores. Começo por Francisco de Goya.

Goya. Atropos o Las Parcas. 1820-1823.
É difícil encontrar autor que tão bem conjugue leveza e turbulência. Principalmente nos Caprichos e durante a “fase negra”. Leveza e turbulência no tema e no traço, testemunhos de uma vida e de uma obra conturbadas, senão trágicas. Figuras e pessoas erguem-se nos ares desassossegadas e ameaçadoras: bruxas, monstros, parcas, bestas e seres humanos, ou seja, “os fantasmas de Goya”, título de um filme de Milos Forman, de 2007, menos sobre o pintor e mais sobre a relação entre uma jovem vítima e o seu agressor, um inquisidor, um caso de síndrome de Estocolmo.
Francisco de Goya. Leveza e Turbulência. Uma selecção.
Leveza e Turbulência
“O seu drama não era o drama do peso, mas o da leveza. O que se abatera sobre ela não era um fardo, mas a insustentável leveza do ser” (Milan Kundera).
A leveza não se reduz à ausência de gravidade. Agradece turbulência. Exterior e, caso disso, interior. Turbulência interior dos santos levitantes, turbulência exterior nos anúncios de Pucho Mentasti. A leveza não emerge de águas pasmadas com rochedos sonolentos. Pendura-se nas asas do vento.
No anúncio “Hojas y viento”, para a Ford, o vento eleva as pessoas. No anúncio “viento”, também para a Ford, tudo se desprende graças ao vento. Predomina, em ambos os anúncios, a sensação de libertação.
Marca: Ford S-Max. Título: Hojas Y viento. Agência: J. Walter Tompson Buenos Aires. Direcção: Pucho Mentasti. Argentina, 2009
Marca: Ford. Título: Wind. Argentina, 2007.