Vestir os Nus. Vídeo da conferência
Eu saí nu do ventre da minha mãe e nu hei de voltar ao seio da terra. Deus mo deu, Deus mo tirou (Job: 1:21)
Na última década e meia, pouco me preocupei com a divulgação dos meus estudos. Quando muito um ou outro apontamento no blogue Tendências do Imaginário. Entretanto, a predisposição mudou. Passei a atender à transmissão dos conhecimentos amealhados, desde que pelos canais e do modo que bem entendo: sem demandas, candidaturas ou submissões. Multiplico, portanto, conversas e partilhas. Durante três dias a fio, empenhei-me na montagem do vídeo da conferência “Vestir os Nus: Censura e Destruição da Arte”. Embora obra de amador, não deixo de apresentar o resultado obtido.
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Acabei de me inteirar de um novo caso de “agasalho de um nu”. Desta vez, o São Sebastião, de Guido Reni (1617-1618), da coleção do Museu do Prado. Acabado de restaurar, o original está exposto desde o mês de março.
A música soturna de Anna von Hausswolff

Na mitologia grega, Electra induziu o seu irmão Orestes a assassinar a sua mãe Climnestra para vingar a morte do seu pai Agamémnon por esta arquitetada. Carl Gustav Jung propôs a noção de complexo de Electra como contrapartida do complexo de Édipo.
Partilhada pelo meu primo Bruno, a primeira música que ouvi hoje foi “‘The Mysterious Vanishing of Electra”, interpretada pela sueca Anna von Hausswolff, cantora já contemplada neste blogue (https://tendimag.com/2012/11/09/anna-von-hausswolff/). Adicionei duas músicas para aprofundar o impacto: “Liturgy of Light” e “Funeral for My Future Children”. Uma maneira bastante lúgubre de começar o dia. Quer-me parecer que o ambiente acústico só poderá melhorar.
O fóssil e a acendalha


Eros e Thanatos. Instintos de vida e morte. O amor é vida. Que a vida não o esqueça.
Norte-americana, com formação em canto operático, Minnie Riperton iniciou a sua carreira em soul, rythm e rock, aos 15 anos. A canção “Lovin’You”, do álbum Perfect Angel, foi um dos grandes sucessos da década de setenta. Morreu de cancro da mama, em 1979, com apenas trinta e um anos.
Os fósseis podem funcionar como acendalhas?
Ésquilo, o abutre e a tartaruga


Ando absorvido, acelerado e fragmentado. Excessivo na recuperação do tempo perdido, sinto-me a ultrapassar o ponto previsto pelo princípio de Peter. Quinta, 15, entrevista aos Porto Canal sobre os Farrangalheiros de Castro Laboreiro; sábado, 18, a conferência “Vestir os Nus”, no Museu D. Diogo de Sousa; ontem, 24, arguição da dissertação, excelente, de Sílvio Messias dedicada à figura do palhaço; hoje e amanhã, últimos retoques no capítulo “Castro Laboreiro: Acessibilidade e migrações até aos anos 1930”; na próxima semana, duas atividades previstas no âmbito do Fórum Cidadania: Pela Erradicação da Pobreza (BRAGA) de que sou membro; na quinta, 2 de março, gravação de entrevista sobre o nu na sociedade atual para o programa da A Voz do Cidadão, da RTP, a emitir sábado, 4 de março, às 14 horas; no sábado, de manhã, às 10 horas, aula “A arte do restauro: Alcance e dilemas”, no mosteiro de Tibães (ver programa anexo).

Mais tartarugas me vão cair, certamente, na cabeça. Poucas folgas para o Tendências do Imaginário e o Margens. A agenda lembra demasiado o ritmo e as variações de algumas composições espanholas. Sem a formosura das intérpretes Ana Vidovic e Alexandra Whittingham. Não me resta outra solução senão abrandar e fazer escolhas. Como se costuma dizer, já não tenho estofo nem pedalada para tanto.
A propósito da “queda de tartarugas na careca”, Jean-Martin Rabot, uma autêntica enciclopédia dos óbitos de celebridades, relata este derradeiro episódio de Ésquilo, completamente calvo, na ilha da Sicília.
Algumas aves quando pretendem quebrar um objeto duro, agarram-no, sobem alto e deixam-no cair. Um abutre pegou uma tartaruga e lançou-a contra o que lhe pareceu uma pedra a brilhar no solo. Era a cabeça de Ésquilo que caiu fulminado.

Lembrete: Censura e destruição da arte e na atualidade
Escolhi um dia aziago para a conferência e a mesa redonda sobre a censura e a destruição da arte e na atualidade. Coincide com as “férias do carnaval” e com a comemoração do Dia da Universidade do Minho. Renovo o convite. Amanhã, lá estarei. Será uma oportunidade para reencontro de amigos e (ex)alunos.

Vestir os nus em vésperas do carnaval

No próximo dia 18, sábado, às 17 horas, apresento a conferência “Vestir os Nus. Censura e Destruição da Arte”, no auditório do museu arqueológico D. Diogo de Sousa, em Braga. Seguir-se-á, às 18 horas, noutra sala, com direito a bebida quente, uma mesa redonda sobre a censura na atualidade, com participação de vários amigos. Junto, como convite, o cartaz. Vai ser um encontro agradável e, estou em crer, compensador. Espero por si!
O riso da mulher grávida (revisto)
Albertino Gonçalves
Este texto corresponde a um dos capítulos do livro A Arte na Morte, em teimosa revisão desde 2017. Trata-se de uma versão renovada e consideravelmente aumentada de um artigo homónimo já publicado no blogue Tendências do Imaginário (O Riso da velha grávida 2016).

No canto inferior esquerdo do painel central do Tríptico As Tentações de Santo Antão (c. 1500), Hieronymus Bosch introduz uma criatura deveras complexa e estranha: uma velha, montada num rato. A velha é um ser híbrido: da cabeça cresce uma árvore e os braços são ramos; o corpo termina em cauda. A velha segura nos braços um bebé enfaixado. Naquele tempo, era prática enfaixar os recém-nascidos. Assim é retratado o menino Jesus no presépio já no século IV (Figura 3) e ainda no século XVII (Figura 4).



Contemplamos uma velha na antecâmara da morte que segura, encostada ao ventre, uma criança. Extrapolando, reconhece-se o tópico da morte que alberga a vida, tópico amplamente estudado por Mikhaïl Bakhtin. Esta figura convoca ainda, através do hibridismo da velha, os três reinos da vida: o humano, o animal e o vegetal. O conjunto, cósmico, alude ao ciclo natural e contrapõe verticalmente o telúrico, o rato que evolui num líquido lamacento, ao aéreo, a árvore que demanda o céu.


Na Grécia, em particular na Beócia, descobriram-se várias estatuetas de terracota que, datadas por volta do século IV aC, podem ser, de algum modo, consideradas antepassadas da velha de Hieronymus Bosch. Das figuras 5 a 7, destaco a última, da coleção do British Museum, pelo seu dinamismo e exposição comunicativa, significados pela posição, boca aberta e dobras da roupa, expressivas do movimento e da tensão dos contrários. Parece falar, cantar ou rir animadamente enquanto cuida da criança.
Entre a criança ao colo e a gravidez vai apenas um passo no tempo. Um passo atrás que desenha uma ligação ainda mais íntima entre a vida e a morte.
“Entre as célebres figuras de terracota de Kertch, que se conservam no Museu L’Ermitage de Leningrado, destacam-se velhas grávidas cuja velhice e gravidez são grotescamente sublinhadas. Lembremos ainda que, além disso, essas velhas grávidas riem. Trata-se de um tipo de grotesco muito característico e expressivo, um grotesco ambivalente: É a morte prenhe, a morte que dá à luz” (Mikhail Bakhtin, A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: O contexto de François Rabelais, São Paulo, HUCITEC, 1987, pp. 22-23).


Só de as imaginar, estas pequenas estatuetas de terracota provenientes de Kertch, na Crimeia, fascinam. Há anos que as procuro. Mas se a Internet é pródiga quando o tema de pesquisa é abrangente, costuma mostrar-se somítica quando este é deveras específico. Não obstante, alguns autores (e.g. Katia Vanessa Tarantini Silvestri, Carnavalização como transgrediência da multidão, Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal de São Carlos, para a obtenção do Título de Doutora em Linguística, São Carlos, 2014, pp, 134-135) contemplam uma estatueta que condiz com as velhas grávidas de Mikhail Bakhtin: uma mulher, em pé, aparentemente idosa e grávida (Figura 8). Provém de Kertch, contanto se encontre no Museu do Louvre, em Paris, e não no Museu L’Ermitage, em São Petersburgo. Cada vez que observo esta “velha grávida” convenço-me que é precursora da Gioconda: não consigo descortinar se está ou não a rir.
Não muito longe de Kertch, na região de Beócia, na Grécia, foi descoberta uma estatueta com uma mulher, agora sentada, numa postura semelhante à da velha ama com bebé da figura 7: idosa, obesa e, com boa vontade interpretativa, grávida e risonha (Figura 9). Também não está no L’Ermitage, mas no British Museum. Condiz com as figuras de terracota de Mikhail Bakhtin. Convergem, inclusivamente, na data: por volta do século IV aC).
Antes de prosseguir este rosário de imagens com velhas com crianças, ao colo ou no ventre, ilustrativas do ciclo da vida e da morte, importa proceder a um desvio pela mitologia grega. Produzida há mais de 4500 anos, a “Vénus Adormecida”, do Museu Nacional de Arqueologia em Valetta (Malta), servir-nos-á como chave ou introito. Dorme, redonda, como a Terra Mãe, à espera da regeneração (Figura 10). Um sono de Inverno com sonho de verão. Batizaram-na Vénus (Afrodite, na mitologia grega). Parece aguardar, durante o inverno, o belo Adónis.
Afrodite apaixonou-se por Adónis ainda este era criança. Entregou-o à guarda de Perséfone, que, por seu turno, também se toma de amores por ele. Ambas reclamam Adónis. Zeus, chamado a pronunciar-se, é salomónico. Divide o ano em três partes iguais: durante os meses de inverno em que as sementes estão soterradas, Adónis vive no inferno com Perséfone; na primavera, quando as sementes germinam, Adónis vive com Afrodite; os meses restantes ficam à escolha de Adónis, que opta por Afrodite. Adónis é o deus da morte e da ressurreição, um deus ctónico, associado à vegetação. Durante a sua estadia no submundo, a terra é estéril. A partir da Primavera, a terra torna-se fértil. A vida enterra a vida, a morte dá à luz a vida. Sem tréguas, nem dramas. Uma tragédia.
A própria Perséfone, igualmente bela, teve um destino similar, embora com enredo e protagonistas distintos.
Divertia-se Perséfone, filha de Deméter, por entre as flores quando ao aproximar-se de um narciso se abriu uma fenda no solo através da qual Hades a raptou e levou para o submundo. Ignorando o sucedido, Deméter, deusa associada à maternidade, a tudo que envolve a plantação, a nutrição e o crescimento, mas também à morte, à destruição e à transformação, procura a filha, sem comer, dormir ou banhar-se, durante nove dias e nove noites. Informada do rapto por Hélio, deus do Sol, assim como da conivência de Zeus, retira-se do monte Olimpo e, disfarçada de velha, divaga, inconformada, por cidades e campos. Em Elêusis, manda construir um templo em sua honra, onde permanece isolada e inativa. Sem a sua ação, nada germina, tudo permanece estéril. A miséria ameaça destruir a humanidade, privando os deuses das suas ofertas e sacrifícios. Após várias tentativas infrutíferas para demover Deméter, Zeus acaba por ordenar a Hades a libertação de Perséfone. Antes da partida, Hades oferece sementes de romã a Perséfone que as saboreou. Durante o reencontro, Deméter pergunta a Perséfone se tinha comido alguma coisa no submundo. Fatalmente! Por causa das sementes de romã, Perséfone resulta condenada a ser, durante o
inverno. rainha do submundo junto a Hades [sina semelhante à de Adónis]. Deméter devolve a fertilidade à terra e promove os Mistérios Elêusianos, festival durante o qual as pessoas “adquirem sabedoria para viver com alegria e morrer sem medo da morte” (remeto a análise do mito de Perséfone para o estudo de Camila Golegã e Luciana Romano Hernandes: “Deméter e Perséfone – A inexorabilidade cíclica da natureza” (https://offlattes.com/archives/author/camila-golega; acedido em 28.08.2022). Retenho, contudo, um pormenor: as sementes de romã. Até as sementes podem desempenhar um papel negativo, neste caso, a condenação de Perséfone. Símbolo por excelência da fecundidade, as sementes também padecem da duplicidade do devir. Morrem e renascem duas vezes: enterradas, para dar o trigo; queimadas para dar o pão. Pela terra e pelo fogo.
Mas nem a intensidade semiótica da semente nem o ciclo cósmico justificam o desvio pela mitologia grega. Este faculta, na verdade , o acesso a uma figura mítica tão pouco conhecida quanto prodigiosa: Baubo, “um arquétipo da vida, da morte e da fertilidade”, “deusa pagã grega da alegria e obscenidade, com a forma de uma velha gorda que exibe publicamente os genitais” (Figuras 11 a 13), mencionada, entre outros, por Goethe, em “Noite de Walpurgis” do Fausto (1808), e Nietzsche, na Introdução de A Gaia Ciência (1882).



“Imagens com mulheres grávidas e mulheres com as pernas abertas passaram a ser representadas em terracotas de estilo Tanagra no Egito a partir do período ptolemaico [iniciado em 323 a. C. Algumas terracotas apresentavam os atributos de Ísis-Afrodite e possuíam um corpo gracioso. Outras tinham escasso ou nenhum atributo, um corpo rechonchudo e pernas abertas para exibir os genitais. A estas terracotas estranhas costuma chamar-se Baubo, o nome de uma velha senhora que mostrou os seus órgãos genitais a Deméter para distraí-la da dor provocada pela perda de Perséfone. O nome Baubo aparece nos Fragmentos órficos de Clemente de Alexandria e Arnóbio que descrevem o episódio do rapto de Perséfone. Baubo também era alvo de culto, em conjunto com Deméter, em várias áreas do mundo grego, como demonstram diversas inscrições e estatuetas. O motivo para atribuir a designação “terracotas Baubo” a estas terracotas egípcias decorre da postura assumida de exposição dos genitais tal como Baubo fez com Deméter. Um outro motivo prende-se ainda com uma outra relação clara de algumas dessas terracotas egípcias com Deméter: existem vários exemplares com a imagem egípcia de Baubo sentada num javali [Figura info], gesto que lembra os javalis selvagens sacrificados durante o festival grego da Thesmophoria. Tanto os rituais da Elêusis como a Thesmophoria eram celebrados na região de Elêusis em Alexandria, com provável recurso a estas terracotas nestes contextos (Nifosi, Ada (2021) The Throw of Isis-Aphrodite: a rare decorated knucklebone from the Metropolitan Museum of New York. The Journal of Egyptian Archaeology. Acedido em 28.08.2022).


Existem várias versões do episódio de Baubo, algumas mais circunstanciadas e excêntricas como a comentada por Sigmund Freud num pequeno texto de 1916 (“Parallèles mythologiques à une représentation obsessionnelle plastique”, Essais de psychanalyse appliquée, Paris, Éditions Gallimard, 1971, pp. 83-85).
“Baubo é a esposa mítica de Disaule, bem como a empregada/ama que acolhe Deméter em Elêusis – o umbigo esotérico da Europa – quando esta procura desesperadamente a sua filha Perséfone. Recusando-se Deméter a tocar na comida, Baubo fá-la rir levantando o vestido e mostrando obscenamente os seus órgãos genitais. Iacchus, seu filho, também é reputado ter estado presente nesta cena, e ter aplaudido descontroladamente – o que provoca o riso de Deméter e enfatiza o lado cômico do episódio. Em algumas versões da história, diz-se que Iacchus rastejou sob as saias, de tal modo que seu rosto apareceu no lugar dos genitais quando Baubo exibiu suas partes púdicas, o que pode ser lido como uma alusão à fertilidade de Baubo – ela pode estar grávida – e, portanto, como um sinal de esperança para a fecundidade muito mais significativa que a própria Deméter tem que reencontrar, a fim de resgatar o mundo do inverno eterno” (Michele Cometa, “The Survival of Ancient Monsters: Freud and Baubo” in Raul Calzoni / Greta Perletti (eds.), Monstrous Anatomies. Literary and Scientific Imagination in Britain and Germany during the Long Nineteenth Century, Göttingen, V&R Unipress, 2015, pp. 297-310).


Baubo oferece-se como uma súmula de todas as situações, ações e propriedade até agora consideradas: é uma velha, grávida e com criança, pujante, cuja sexualidade desbragada provoca alívio e riso. Integra uma mistura de ações e atributos, um concentrado semiótico capaz de rivalizar com a “a velha com bebé ao colo” de Hieronymus Bosch. Condensa luto, fecundidade e jovialidade numa fusão apotropaica transbordante de sexualidade e humor. Os opostos mais do que se alternar ou de se (su)ceder uns aos outros coexistem. Prevalece a conjunção em detrimento da disjunção. Baubo é, simultaneamente, morte e vida, Eros e Thanatos, ordem e caos, tragédia e comédia, luto e esperança. Esta leitura corresponde, naturalmente, a uma interpretação, uma camada subjetiva de sentido que reveste Baubo. Tomando o presente texto como um todo, como um retrato, Baubo arrisca, com a sua turbulência, oferecer-se como um punctum, “o detalhe que preenche toda a fotografia” (Roland Barthes, A Câmara Clara, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1984, p. 73).
Chegada a navegação a esta “bacia semântica”, terão os nossos olhos visto o que de essencial há para ver? Saturou-se o imaginário? A modernidade e a pós-modernidade pouca ou nenhuma originalidade acrescentam, limitando-se a repetir e reciclar? Convenha-se que, mínimas ou não, algumas alterações e inovações se verificaram.
A morte passa a ser menos disfarçada ou subentendida. A velha tende a ser substituída pela própria morte ou, mais precisamente, pela sua principal imagem-signo: o esqueleto. Volvidos quatro séculos da conclusão das Tentações de Santo Antão, no quadro A Morte e as Máscaras, datado de 1927, de James Ensor, destaca-se, entre os mascarados, um recém-nascido segurado ao colo não de uma velha mas de um esqueleto, a única figura sem máscara (Figura 18). Ressurge este tópico, por exemplo, nos motivos para tatuagem criados por Mason Williams (Figura 19).

Mas esta diferença não deve ser sobrevalorizada. Inúmeros esqueletos, com ou sem carne, passeiam-se pelas pinturas e gravuras medievais e renascentistas. E fazem praticamente tudo o que é caraterístico de um ser humano (ver Vida de Esqueleto II. O Espelho: https://tendimag.com/2017/09/30/vida-de-esqueleto-ii-o-espelho/). Não é, aliás, de descartar a possível existência, que admito desconhecer, de uma qualquer imagem com um esqueleto a dar colo a uma criança. Registe-se que alguns esqueletos das danças macabras parecem tentados a embalar um berço. Por exemplo, na gravura da dança da morte mais antiga de que se tem conhecimento situada no cemitério dos Santos Inocentes, em Paris (Figura 20).
Cumpre a Georg Grosz, pintor da desgraça humana do século XX, patentear a principal singularidade da nossa era. Na pintura Estou feliz por estar de volta, de 1943, um esqueleto andrajoso rasga a carne ensanguentada de um ventre rumo à luz, ao exterior, ao mundo (Figura 21). Eis a nova marca dos dois séculos mais recentes, modernos ou pós-modernos. Já não é só a morte que apaga a vida, a própria vida dá à luz a morte. No novo imaginário, muda a física, a geografia, e a orgânica, a progenitura, da relação entre a vida e a morte, este mundo e o outro. Nos séculos antigos, se o diabo andava, omnipresente, à solta, o inferno situava-se no Além, no outro mundo. Agora, o inferno está entre nós, “o inferno são os outros” (Jean-Paul Sartre, Huis Clos, 1944) ou, mais lucidamente, “somos nós”. Numa “sociedade mortífera”, a própria vida se encarrega de gerar a morte.
Autor: Albertino Gonçalves
Inteligência Artificial, Machine Learning e composição musical

Pedro Costa, doutorado em Sociologia, investigador do CECS – Centro de Estudos Comunicação e Sociedade, acaba de publicar o artigo A Inteligência Artificial e Seus Herdeiros no blogue Margens (https://tendimag.com/?p=55533). Um ensaio sobre a Inteligência Artificial, o Machine Learning e o futuro da criatividade, designadamente no que respeita à música. Pertinente, oportuno, bem escrito, fundamentado e criteriosamente ilustrado, trata-se de um texto raro, subtil e ousado. Aproveito para acrescentar quatro vídeos excelentes relativos a outras tantas músicas emblemáticas da relação entre o homem, a máquina e as emoções: The Robots (1978), dos Kraftwerk; Wellcome To The Machine (1975), dos Pink Floyd; All Is Full Of Love (1997), da Bjork; e How Does It Make You Feel (2001), dos Air.
O Olhar de Deus na Cruz. O Cristo Estrábico
Porque já sabeis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, por amor de vós se fez pobre; para que pela sua pobreza enriquecesseis (São Paulo, 2 Coríntios 8:9).


Consegui extrair a lição sobre o “Cristo estrábico” (de 29 de novembro) com o som mais nítido. Ao vídeo no YouTube, acrescento a respetiva apresentação (Powerpoint). Fica assim concluído o episódio, grato, da homenagem. Outras atividades esperam: um capítulo, com o Américo Rodrigues, para um livro sobre Castro Laboreiro; a criação, que se arrasta, de um blogue coletivo; e a preparação da aula “Vestir os nus: a destruição e a censura da arte”, prevista para o dia 18 de fevereiro.
Para aceder à apresentação em powerpoint, descarregar a partir do seguinte link:
Homenagem (29.11.2022)

Depois da homenagem, resta o registo com quase três horas de duração. Recomendava-se a montagem do vídeo com cortes, colagens, focagens e legendas, mas o software habitual teimou em encadear erros e abalar a paciência. É verdade que o original pesava mais de 25 GB. Segue, portanto, o registo integral, bruto, da câmara de filmar, apenas convertido a um formato vinte vezes menos pesado (1,36 GB).

Torna-se assim possível visionar a sessão a modos como sentado no lugar fixo da câmara, com a vantagem de saltar ou rever esta ou aquela passagem. Infelizmente, o som podia ser melhor, designadamente nas intervenções com recurso ao microfone. Foi esquecimento não colocar o microfone da câmara de filmar na mesa. Tal como uma fotografia de um filme perde nitidez, a gravação através de uma câmara de filmar de um som emitido por colunas perde qualidade porque as ondas são distintas.

Agradeço a iniciativa do Departamento de Sociologia, da Câmara de Melgaço e do Centro de Estudos Comunicação e Sociedade, a disponibilidade do Museu de Arqueologia Diogo de Sousa, as intervenções de Alexandra Lima, Carlos Veiga, Manoel Baptista, Madalena Oliveira, Moisés Martins e Álvaro Domingues, a interpretação do Francisco Berény Domingues, a presença do Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Melgaço e a dedicação da Rita Ribeiro, do Joaquim Costa e da Alice Matos.
Anexo o vídeo com quase toda a sessão. A parte em falta, com as primeiras danças do Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Melgaço e a receção por parte da direção do Museu de Arqueologia D. Diogo de Sousa, está disponível no seguinte link: https://tendimag.com/2022/12/05/grupo-etnografico-da-casa-do-povo-de-melgaco-inicio-da-homenagem/.
Índice
Abertura:
Joaquim Costa (Departamento de Sociologia) – 00:.0:40
Carlos Veiga (Departamento de Sociologia) – 00:05:10
Manoel Baptista (Câmara de Melgaço) – 00:18:33
Madalena Oliveira (Centro de Estudos Comunicação e Sociedade) – 27:24
Apresentação:
Moisés de Lemos Martins (Universidade do Minho) – 00:37:38
Moderação:
Alice Matos (Departamento de Sociologia) – 01:06:36
Lição “O Olhar de Deus na Cruz: o Cristo Estrábico“:
Albertino Gonçalves – 01:08:30
Momento musical:
Francisco Berény Domingues (Guitarra) – 01:49:09
Testemunho:
Álvaro Domingues (Universidade do Porto) – 02:02:52
Oferta:
Daniel Noversa (Doutoramento em Estudos Culturais) – 02:14:28
Apresentação do livro Sociologia Indisciplinada
Rita Ribeiro (Departamento de Sociologia) – 02:16:22
Dança (2ª parte):
Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Melgaço – 02:22:24