A cor e o farnel
Dois anúncios portugueses acabados de sair. Um contra o racismo, o outro pelo hambúrguer! Ambos contam histórias, que lembram episódios de séries de televisão. No primeiro, Stop (SOS Racismo), um jovem negro não escapa à conjunção de dois actos de racismo. No segundo, Typical McDrive (McDonald’s), o hambúrguer vai às festas de Santo António, de tão típico e familiar.
Anunciante: SOS Racismo. Título: Stop. Agência: Havas Worldwide Lisboa. Direcção: Roger Serrasqueiro. Portugal, Abril 2015.
Marca: McDonald’s. Título: Typical McDrive. Agência: TBWA Lisbon. Portugal, Abril 2015.
A música e a comunicação das almas
“A música ajudava-me a descer em mim mesmo, a descobrir em mim coisas novas (…) Eu pensava comigo se a música não era o exemplo único (…) da comunicação das almas” (Marcel Proust, Em Busca do Tempo Perdido – A Caminho de Swann).
Music Has No Enemies é uma organização que produz música e conteúdos multimédia para instituições não lucrativas socialmente responsáveis. Um anúncio excelente.
Marca: Music has no enemies. Título: Jack. Agência: Latinworks. Direcção: Carlos Lopez Estrada / CINCO. USA, Abril 2015.
Papoilas
Graças a um toque de fada, as papoilas de um jardim subaquático ascendem aos céus de Paris. “Para um mundo mais belo”. Onírico e divertido, como um quadro de Magritte, o perfume deste anúncio não é o Opium de Yves Saint Laurent, mas o Flower de Kenzo.
Marca: Kenzo. Título: Flower by Kenzo. Agência: Kenzo. Direcção: Patrick Guedj. França, 2013.
Magnetismo
A levitação e o magnetismo podem coexistir como no caso do comboio de levitação electromagnética (TGV japonês). Mas, neste anúncio, os corpos atraídos não conseguem desprender-se. O que não é prático, nem confortável. Felizmente, há, algures, um banco que chegou à conclusão que “in a changing world, you don’t have to do everything together”.
Marca: BPN Paribas Fortis. Título: Magnets. Agência: Publicis. Direcção: Koen Mortier. Bélgica, Abril 2015.
Cosméticos
Não basta “encher os olhos”, importa regalá-los. E desintelectualizar. Este anúncio da L’Oréal, dirigido por Bruno Aveillan, lembra outro mais antigo da OPI (2012). Ambos franceses, a marcas de cosméticos, centrados na cor, cada um com o seu esquema de sedução: a fragmentação sensual e um repto de dança a um cavalo, “animal das trevas e do poder mágico”, símbolo “da impetuosidade do desejo” (Chevalier, Jean & Gheerbrant, Alain, Dictionnaire des Symboles, Paris, Robbert Laffont/Jupiter, 1982, p. 223).
Marca: L’Oréal. Título: Color Rich. Agência: McCann. Direcção: Bruno Aveillan. França, Março 2015. Música original: Raphaël Ibanez de Garayo.
Marca: OPI. Título: Instinct of Color. Agência: DAN Paris. Direcção: Hans Emanuel. França, Outubro 2012.
Dentro e fora. O olhar do século.
Dentro ou fora? De dentro para fora? De fora para dentro? Dentro e fora.
Para Francesco Casetti, o cinema é o olhar do século XX (L’occhio del Novecento. Cinema, esperienza, modernità, Milano, Bompiani, 2005), um olhar que entra no ecrã, do cinema ou da televisão (Dentro lo sguardo. Il film e il suo spettatore, Milano, Bompiani, 1986; com F. di Chio, Analisi della televisione. Strumenti, metodi e pratiche di ricerca, Milano, Bompiani, 1998).
“With regard to vision, the film aims to “fill the eyes” of the spectator, to solicit him sensually: the filmic experience mobilizes a perceptive intensity that allows the spectator to “immerse” him or herself in that which he or she is watching. In this sense we can say that filmic images, more than objects to be seen, constitute a visual environment. But film seems to do other things, as well: it seems to want to “restitute” to the spectator that reality which on the screen is not present if not in its appearance; and it seems to want to do so through an illusion” (Casetti, Francesco, 2007, The Filmic Experience: An Introduction, p. 10: https://francescocasetti.files.wordpress.com/2011/03/filmicexperience1.pdf).
O envolvimento visual, além de propiciar a entrada do olhar no ecrã, promove a imersão do próprio espectador, convidado a co-construir a experiência fílmica. “O olhar do século XX” não é apenas imersivo, não se limita a “encher os olhos”, é também interactivo. A imersão coexiste com um sentido de distanciação. Dentro e fora, o cruzamento de olhares conjuga-se na experiência fílmica. O anúncio do Seattle International Film Festival contempla, de algum modo, este tango de perspectivas.
Anunciante: Seattle International Film Festival / SIFF. Título: Be Watching. Agência: Wongdoody. Direcção: Lindsay Daniels. USA, 2015.
Partilha
“O casamento faz de duas pessoas uma só, difícil é determinar qual será” (William Shakespeare). Desta vez tenho as minhas reservas quanto ao pensamento de Shakespeare: o casamento é partilha, de longa duração.
Marca: Thierry Mugler. Título: The Angel Effect. Agência: Moxie. Direcção: Rémi Devouassoud. França, 2014.
A passo de caranguejo. A canção da morte
Ao passar um vídeo sobre o grotesco (http://tendimag.com/2012/08/31/o-desconcerto-do-mundo/), costumo relevar, na sequência dedicada às danças da morte, a correspondência entre os versos da Dança Macabra de Pinzolo (Itália, 1539) e a letra da música, de fundo, de Angelo Branduardi: Ballo in Fa diesis Minore (Sono Io la Morte; 1977).
“Sono io la morte e porto corona,
io Son di tutti voi signora e padrona
e così sono crudele, così forte sono e dura
che non mi fermeranno le tue mura.Sono io la morte e porto corona,
io son di tutti voi signora e padrona
e davanti alla mia falce il capo tu dovrai chinare
e dell ‘oscura morte al passo andare.Sei l’ospite d’onore del ballo che per te suoniamo,
posa la falce e danza tondo a tondo
il giro di una danza e poi un altro ancora
e tu del tempo non sei più signora”.
Angelo Branduardi. Ballo in Fa diesis Minore (Sono Io la Morte). La pulce d’Acqua. 1977.
Não é fácil detectar este tipo de coincidências. São saltos laterais na “linha do raciocínio”. De desvio em desvio, anda-se “a passo de caranguejo”. Recordando Marshall McLuhan, trata-se de ensinar menos por mensagem e mais por massagem.
Angelo Branduardi é um compositor e interprete folk / rock italiano. “Trovador contemporâneo”, inspira-se na música medieval e renascentista. Compõe, frequentemente, letras alheias. Consta entre os compositores e cantores mais famosos da Europa (além-Pireneus). Partilhou uma música com Teresa Salgueiro, Nelle Palludi di Venezia (2000), integrada no álbum Obrigado (2005). De Itália até Portugal, a passo de caranguejo.
Angelo Branduardi e Teresa Salgueiro, Nelle Palludi di Venezia. 2000. Teresa Salgueiro, Obrigado, 2005.
A amizade
Um amigo enviou-me este anúncio da Super Bock. Imagens, texto e voz magníficos, dedicados à amizade, uma graça que não se decreta. Os sentimentos e as emoções constituem o último reduto da nossa pessoalidade e liberdade. Mas não escapam ao controlo médico, psicológico, judicial e político. Nada parece escapar ao poder! Nem sequer um abraço, um desejo, um sorriso ou uma lágrima. Tantos são os meios, os motivos e os peritos.
Marca: Super Bock. Título: O que se Passa com a Amizade? Agência: Havas Worldwide / O Escritório. Portugal, Abril 2015.