Jesus Cristo Superstar

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Um excelente anúncio, bem concebido, bem realizado e bem humorado, pela e para a companhia de produção canadiana 1One Production, que opta por um tema original: Jesus Cristo reúne com os apóstolos para promover a sua imagem de marca.

Marca: 1One Production. Título: Jésus. Agência: Lg2. Produção: 1One Production. Direção: Pierre Dalpe. Canadá, Fevereiro 2015.

Segundo Mikhail Bakhtin, nada escapa ao riso grotesco, nem o político, nem o sagrado. Acrescente-se que também nada escapa à publicidade. Nada? Talvez os símbolos que mordem… Não é o caso do papa nem de Jesus Cristo. Este anúncio é ousado? Ousado seria, certamente, há quatro séculos atrás, a braços com a Inquisição! Longe de mim censurar o anúncio. Mas, embora não crente, arranha-me alguns valores. Hoje, repito, é fácil parodiar Jesus Cristo, inclusivamente estupidificá-lo e, por tabela, estupidificar alguns de nós. Alguma ousadia exigiria, porém, parodiar outras figuras religiosas. A publicidade ri-se de tudo? Não, tem tabus e escapa-lhe metade do globo. A estupidez de Cristo foi pregar o amor, estupidez que persiste 2 000 anos depois.

Cristo vende e alguém anda a vender Cristo, por uns dinheiros. Mas não é Judas. Guerra Junqueiro enganou-se ao pensar que só os parasitas da Igreja vendiam a imagem de Jesus.

Leal da Câmara. A Velhice do Padre Eterno, de Guerra Junqueiro.

Leal da Câmara. A Velhice do Padre Eterno, de Guerra Junqueiro.

Volta e meia, ensimesma-nos a remover sedimentos. Não gostamos, por isso, que os pisem. A Velhice do Padre Eterno era um dos livros predilectos de meu tio. Meu avô recitava de cor o poema O Melro (18 páginas). Gente com qualidade. Possuo a edição da Livraria Lello & Irmão de 1926, ilustrada por Leal da Câmara. Digitalizei a imagem correspondente ao poema Parasitas. Guerra Junqueiro, “vencido da vida”, era um patriota. Incomodava-o a crise económica, mas, sobretudo, a crise da dignidade. Subscrevo, com os olhos postos na actualidade.

PARASITAS

No meio d’uma feira, uns poucos de palhaços
Andavam a mostrar em cima d’um jumento
Um aborto infeliz, sem mãos, sem pés, sem braços,
Aborto que lhes dava um grande rendimento.

Os magros histriões, hypocritas, devassos,
Exploravam assim a flor do sentimento,
E o monstro arregalava os grandes olhos baços,
Uns olhos sem calor e sem entendimento.

E toda a gente deu esmola aos taes ciganos;
Deram esmola até mendigos quasi nus.
E eu, ao ver este quadro, apóstolos romanos,

Eu lembrei-me de vós, funâmbulos da Cruz.
Que andaes pelo universo há mil e tantos annos
Exhibindo, explorando o corpo de Jesus.

Guerra Junqueiro, A Velhice do Padre Eterno, 1885.

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