O naufrágio da modernidade

Nada como uma boa ideia, de preferência simples e com impacto. Muito impacto. Mesmo que seja num ventre mole. Muito mole. A iniciativa Bihar, uma escultura hiper-realista de uma menina a afundar-se na ria de Bilbao, promovida pela instituição financeira BBK (Bilbao Bizkaia Kutxa), conseguiu uma gigantesca notoriedade gratuita no horário nobre da comunicação social ao nível planetário. Antecipando o futuro, em particular a ameaça das alterações climáticas, a campanha nos media, Leão de Prata em Cannes, desdobra-se num anúncio (2:15) e numa curta-metragem (17:01).
Suicídio

Na Irlanda, os suicídios não interessam a ninguém, as pessoas não querem falar nisso. Receiam que uma simples menção no jornal inspire mais dez mortes similares. É uma epidemia silenciosa. Cada geração tem o seu tabú (Dermot Bolger, A Second Life, 1994).
Esta curta-metragem espanhola, dedicada ao suicídio, intitula-se Émile em homenagem ao sociólogo Émile Durkheim (O suicídio, 1897). “Um assunto espinhoso e tabú”. O vídeo convoca uma crença várias vezes abordada no Tendências do Imaginário: no momento da morte, o moribundo revê num instante toda a sua vida. Mas, pelos vistos, o suicídio não é uma porta, não é uma promessa. Segue a nota de informação que acompanha o anúncio:
Émile (the name of the campaign is a tribute to Émile Durkheim, a pioneer in social research with his work: “Le suicide”) is a campaign to show people who are thinking about killing themselves that it is worth living. It is a campaign that makes people reflect. And he does it through a content, a short film that tells a story that deals with two fundamental themes through the main character. The first is his situation: he lives in Costa Rica, the happiest country in the world, in a luxury house, with a great car, because he has succeeded in his career, but still he is not happy and wants to commit suicide. The second is his age, with more than 40 years, it may seem that his life is no longer able to change. But it can, it can always. And that is the importance of the message, on the one hand it shows you that there is always time for things to change and improve. On the other hand that although from outside it is not understood many people who do not expect it, maybe thinking about commit suicide and you have to realize. And all this is done in a different way, speaking of what is usually said that before we die, you see your life before your eyes like flashes, but if you commit suicide, everything is different. A message of hope on a hard and taboo subject (https://www.adsoftheworld.com/media/film/emile).
Aspirações
“Expliquemos previamente a natureza complexa do riso carnavalesco. É, antes de mais, um riso festivo. Não é, portanto, uma reacção individual diante de um ou outro fato “cómico” isolado. O riso carnavalesco é em primeiro lugar património do povo (esse carácter, como dissemos, é inerente à própria natureza do carnaval); todos riem, o riso é “geral”; em segundo lugar, é universal, atinge a todas as coisas e pessoas (inclusive as que participam no carnaval), o mundo inteiro parece cómico e é percebido e considerado no seu aspecto jocoso, no seu alegre relativismo; por último, esse riso é ambivalente: alegre, cheio de alvoroço, mas ao mesmo tempo burlador e sarcástico, nega e afirma, amortalha e ressuscita simultaneamente” (Bakhtin, Mikhail, A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais, São Paulo, Hucitec, 1077, p.10).
No grotesco, todos riem de tudo e de todos. Tudo é risível, nomeadamente o sagrado e o poder político. Nada permanece estável, o riso grotesco é um agitador e um baralhador do mundo. O alto é rebaixado. Tudo o que se mostra fixo é deslocado para os lugares mais inesperados. O detergente Cif no Cristo Redentor, do Rio do Janeiro, um aspirador associado a um exorcismo, outro a uma tentativa de suicídio, uma pastilha elástica liberta a Estátua da Liberdade, em Nova Iorque.
Primeiro, os aspiradores, máquinas anormalmente intrusas. Amanhã, as estátuas.
Marca: Electolux. Título: Suicide. Agência: Lowe (Shangai). Direcção: Liang Quing Song. China, 2006.
Marca: Dirt Devil. Título: The Exorcist. Produçao: Filmakademie Baden-Wurttemberg. Direcção: Andreas Roth. Alemanha, 2011.
Abismo

Les « fenêtres à vendre », detalhe. Ethiques, politiques et économiques d’Aristote. Séc. XV. Iluminura. Biblioteca Municipal de Rouen, ms 12, fol. 127 v°.
Tudo que tenha efeito de sentido pode interessar à publicidade. Mesmo o tabu mais disfórico. A publicidade é omnívora. E cada vez mais autónoma. Faz caminho pelo seu próprio pé. Declina, também, confinar-se à trindade do bom, do bem e do belo. Pode, por exemplo, contrapor uma paródia grotesca de um suicídio. Não é bom, nem bem, nem belo, mas tem efeito.
Marca: Immoweb. Título: Ouch. Agência: Witloof Productions. Creativo: Fred De Loof. Bélgica, Dezembro 2014.