Nevão

A neve brilha em todos os ecrãs. Também pode brilhar no Tendências do Imaginário. A reportagem da Altominho.tv dedicada ao “primeiro nevão do ano” nas freguesias de Castro Laboreiro e Lamas de Mouro de tão bela merece um pequeno recanto.
Há dias aludi à música “fresca” do trompetista norueguês Nils Petter Molvaer, pioneiro na fusão de Jazz com música electrónica. Algo estranha, parece-me condizer com o vídeo da Altominho.tv.
A Caverna dos Fantasmas de Estimação. The Cinematic Orchestra
Numa poltrona ampla, perto de uma lareira abençoada, pode-se viajar, no inverno, até ao infinito (Hippolyte Laroche)
Há anos que não me expunha assim, tão fora de casa e tão fora de mim. Deixei o mundo penetrar até aos ossos e a expressão soltar-se. Como desfecho, sinto-me massajado, amassado e moído. Surpreendo-me, por drástica que tenha sido a vacina, a desejar o torpor cálido da caverna. Com a visita desta frente nórdica, frio apenas tolero o da música, compassada, suave, minimalista… Etérea!

Por exemplo, a trompete do norueguês Nils Petter Molvær. Ao procurar nos discos, tropecei nos The Cinematic Orchestra. Afins, também servem. Talvez não sejam do agrado de todos, mas não me inibo em partilhar coisas que colidem com o gosto alheio, apenas não partilho aquelas de que não gosto. Acontece colocar música a pensar numa única pessoa, que, porventura, não vejo há uma eternidade e decerto não voltarei a ver. O suficiente. Fantasmas de estimação!
Voz e contrabaixo: Esperanza Spalding
O que é bom dificilmente se estranha.
Meia-verdade do dia:
Nem sempre são de condenar as más ações; podem ser bem intencionadas. Tão pouco devemos louvar sempre as boas ações; podem ser mal intencionadas. Esta ressalva não advoga nem a irresponsabilidade nem a primazia das intenções face aos resultados.
Pôr a vida a pastar
Round like a circle in a spiral, like a wheel within a wheel / Never ending or beginning on an ever spinning reel (Abbey Lincoln, Windmills of your mind).
Com mobilidade reduzida, a relação com o mundo adquire outra feição. Resulta mais lenta e mais minuciosa. Pasma-se com as aventuras da gata, desde os primeiros namoros até ao aleitamento das crias, uma preta como o pai, a outra às listas tal e qual a mãe. Acompanha-se a melra que repete cinco vezes o mesmo voo desde o comedouro dos gatos até às bocas no ninho. Até as plantas se animam: sofrem os limoeiros com as invasoras, têm sede os morangueiros nos vasos e destaca-se a primeira folha avermelhada na cerejeira. Tudo entremeado com música. Hoje, jazz. Partilho três faixas do álbum over the years, de Abbey Lincoln: Windmills of your mind; What will tomorrow bring; e Tender as a rose.
GUIMARÃES JAZZ 2020

Apesar da pandemia, ocorreu, de 12 a 22 de novembro de 2020, a 29ª Edição do Guimarães Jazz. Os obstáculos requerem engenho e inovação. Recorrendo sobretudo a músicos portugueses e estrangeiros a residir em Portugal, o Festival assumiu
um olhar mais alargado do que o habitual sobre o panorama musical nacional, catalisando novas colaborações e suscitando diferentes aproximações artísticas. Apesar das limitações impostas pelas contingências, o Guimarães Jazz mantém-se fiel à sua identidade, sustentada no ecletismo e numa grande abertura estilística e geracional” (Ivo Martins).
A proximidade de um festival com a qualidade e a originalidade do Guimarães Jazz é uma bênção. Apetece acreditar que a cultura está ao nosso alcance. “Pula e avança como uma bola colorida ” (António Gedeão, Pedra Filosofal).
Com o coração

Gosto da Lizz Wright, em particular do álbum The Orchard (2008).Um dos álbuns “recentes” que mais me cativou. Interpretações ao vivo impecáveis. O Tendências do Imaginário já contempla duas canções, por sinal, as mais populares, Coming Home e I Idolize You (https://tendimag.com/2016/08/16/greve-da-escrita/). Seguem mais duas: Speak Your Heart e Hit The Ground.
Demasiado velho para sonhar

Há notícias funestas que ameaçam as identidades das pessoas e dos lugares. Em má hora alguém se lembrou de minerar o território do Fojo junto ao Parque Nacional da Peneda-Gerês. A causa é a extracção do lítio e outras substâncias. A consequência é a perfuração do Fojo, com explosões e químicos à mistura. É difícil imaginar pior cenário. São lugares que resistiram a desafios de milhões de anos. Sossega-me acreditar que em Portugal se gosta do País. Gostam as pessoas, os animais e até os políticos. Tenho fé que a caravana, como outras, acabará por passar. O Fojo faz parte do “reino maravilhoso” que Miguel Torga pressente quando sobe rumo a Castro Laboreiro. É enorme o que está em risco: o ser, o estar, o sentir e o prazer das fragas, das águas, dos vales, das plantas, dos animais e, naturalmente, dos homens. Homens estúpidos que optam pelo que os prejudica. Que protegem a natureza com palavras e protocolos. O pior é que a minha geração está “demasiado velha para sonhar”.
Nada daquilo que mostra o anúncio Dream, da WCFF, devia acontecer. E, no entanto, está a chegar ao fim… Junto a canção When I Grow Too Old To Dream, interpretada por Nicki Parrot, com Rossano Sportiello.
Cheiro a Lisboa
A agência Mother London resgata a canção Puttin’ on the Ritz, de 1929, numa animação dançante, com trejeitos psicadélicos e cenários inspirados nas ruas de Lisboa. Formas, cores e ritmos embriagantes. Um anúncio fantástico. Portugal está no vento!
Marca: Ritz. Título: Puttin’on the Ritz. Agência: Mother London. Direcção: Fredrik Bond. UK, Julho 2015.
A música que veio do frio
Os Building Instrument publicaram recentemente o primeiro álbum, homónimo. Trata-se de um trio norueguês. O ano passado, já tínhamos colocado no blogue uma canção de um dos seus elementos: Mari Kvien Brunvoll (http://tendimag.com/2013/02/24/mari-kvien-brunvoll/). A música dos Building Instrument ainda é uma raridade, a merecer alguma atenção.
Building Instrument. Kanskje. Building Instrument. Noruega. 2014.
Irresponsabilidade
Gosto de ser europeu, da Europa “irresponsável”. Gosto da Itália irresponsável. Da arte, dos escritores, da comida, dos scallops Marsala, do futebol, das ragazze, das praças, das igrejas, dos palácios, das fontes … Da música e do cinema, também. Este Caruso de Aldo Romano, apetece ouvi-lo na Piazza Navona, com bandeira brasileira e Fonte dos Quatro Rios. Que irresponsabilidade!
Aldo Romano. Caruso / Estate. Non Dimenticar. 1993.