Vítimas da culpa

Onde quer que exijam responsabilidades, o instinto de julgar e de castigar anda, geralmente, mesclado na tarefa (…) Os homens foram considerados livres para se poder julgá-los e castigá-los, para se poder declará-los culpados (…) O cristianismo é uma metafísica de verdugos.
Friedich Nietzsche (1888), O crepúsculo dos ídolos, Hemus S.A., 2001, p. 41)
Diz-se que a civilização judaico-cristã carrega a cruz da culpa. Como sugere Nietzsche, somos responsáveis logo culpabilizáveis O cristianismo, “uma metafísica do carrasco”, extremou o dispositivo de culpa durante a Idade Média. Atente-se nas imagens da crucificação. Deus feito homem sofre e sangra para expiar os nossos pecados. Na pós-modernidade, continuamos a carregar, monte acima, monte abaixo, a culpa. Somos culpados de tudo e de nada. O papel higiénico e a floresta amazónica, o preservativo e os peixes de Madagáscar, o desodorizante e o clima… Somos vulneráveis à culpabilização. Distribuidores de culpas não faltam. Pagamos-lhes para nos culpar de tudo e absolver de nada. Muitos anúncios enveredam pelo confronto da culpa e da vítima. Especialmente, os anúncios de sensibilização. O anúncio português Karma, da Animalife, está bem concebido e bem realizado. Aposta na sensibilização pela culpabilização. Não advém nenhum mal.