Trabalho em férias

Quino 2Cada vez se trabalha mais, cada vez se vale menos. Ainda bem que a lei prevê as férias:

“A finalidade das férias é «possibilitar a recuperação física e psíquica do trabalhador e assegurar-lhe condições mínimas de disponibilidade pessoal, de integração na vida familiar e de participação social e cultural», conforme estabelece o n.º 2 do artigo 171.º do RCTFP, o que justifica a imperatividade do respectivo regime, designadamente no que concerne à obrigatoriedade do seu gozo e à fixação da sua duração mínima.” (Despacho n.º 4932-A/2011).

E se as férias fossem trabalhadas? Por que carga de água? Por exemplo, por motivo de avaliação. Férias com urgência avaliativa… Nos últimos tempos, a avaliação avolumou-se mais do que o défice, o choque tecnológico, as indústrias criativas ou o empreendedorismo. A avaliação não é o submarino, a avaliação é o balão do país. Para que serve? Para fins que a gente não vê nem percebe. Talvez dê jeito para transformar um acto de potência em acto de direcção (Jean Baechler, Le pouvoir pur, Paris, Calmann Lévy, 1978) e levar a água, abençoada, ao moinho. Perversidades (Raymond Boudon, Effets Pervers et Ordre Sociale, Paris. P.U.F, 1977).

Quino_NEW[1]

Nasci antes da guerra colonial. Não me lembro de tropeçar em tanta sede de poder e em tanta prepotência como nos últimos anos.

Quando se tem férias trabalhadas, sente-se uma espécie de “déconfiture”, como canta Isabelle Mayereau, desconhecidíssima mas imitadíssima, Chevalier des Arts et des Lettres, pelo Ministério da Cultura francês, em 2010. Une déconfiture, um descalabro… Valha-nos uma Quinoterapia.

Isabelle Mayereau. Déconfiture. Déconfiture. 1979

Déconfiture

Je sens comme une déconfiture
Un bout de gâteau dans le thé
Comme un immense, immense mur
Un chewing-gum trop mâché (x2)

Tu sens comme une drôle d’aventure
Où tu vas te risquer
Comme un bleu trop violent d’azur
Comme un vieux jean usé (x2)

Je sens comme une presque blessure
Comme un nuage dans le thé
Comme une pomme acide pas mûre
Comme un pétard mouillé (x2)

Tu sens comme une éclaboussure
Comme un peu de rhum dans le thé
Comme un vent trop violent qui dure
De l’eau dans le canoë (x2)

Je sens comme une déchirure
Un bout de citron dans le thé
En quelque sorte, une éraflure,
Des bleus presque violets (x2)

Il reste de cette mésaventure
Un peu de sel dans le thé
Des ecchymoses, des courbatures,
Une envie de pleurer (x2)

Paroles et Musique: Isabelle Mayereau   1979

 

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