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Destribalizar

Syd Barret (1946-2006)

Syd Barret (1946-2006)

Em “tempo de tribos” (Michel Maffesoli), destribalizar é arriscado. Há tantas tribos! Umas cristalizadas e sólidas, outras moles e passageiras. Todas adubam a comunhão e a identidade. Destribalizar pode perfurar tecidos com laços frouxos e compromissos leves (Zigmunt Bauman).O défice de laços sociais, eventualmente a solidão, afasta-nos do húmus da interacção social (Michel Maffesoli).  As tribos constituem uma componente importante da vida social. Mas subsistem outras componentes. Por exemplo, os nichos e os grupos primários (Charles Cooley), tais como os retiros, a família e os amigos. Na aritmética social, meia dúzia de laços íntimos pode rivalizar com uma chuva de participações tribais. De qualquer modo, a destribalização comporta custos: menos solidariedades mecânicas, menos ecos simbólicos e menos combustões instantâneas. Acresce que a destribalização, o isolamento, é encarada como um ato suspeito, imputável à soberba, à melancolia, à misantropia, à depressão, ao autismo, à esquizofrenia ou a um outro distúrbio mental qualquer. A que propósito vem este reportório? A memória de Syd Barrett, membro fundador e mentor dos Pink Floyd, que foi substituído pelo amigo David Gilmour. Um dos compositores mais criativos da história do rock. Segue o vídeo Shine on crazy diamond, uma homenagem dos Pink Floyd a Syd Barrett.

Pink Floyd. Shine on crazy Diamond. Wish you were here. 1975.

Gárgulas impúdicas

01 Gárgula. Sé Catedral de Braga.

Gárgula. Sé de Braga.

02 Gárgula. Igreja Matriz de Caminha. Localização.

02 Gárgula. Igreja Matriz de Caminha.

03 Gárgula. Igreja Matriz de Caminha. Foto de Manuel Passos.

03 Gárgula. Igreja Matriz de Caminha. Foto de Manuel Passos.

Olhar para cima e deparar-se com um rabo prestes a defecar representa uma experiência estranha mas possível. Em Portugal, existem gárgulas impúdicas na Sé de Braga (figura 1), na Igreja Matriz de Caminha (figuras 2 e 3) e na Sé da Guarda (figura 4). Vigiam-nos um pouco por toda Europa: Espanha, França, Inglaterra, Alemanha… Algumas, além do rabo, exibem os genitais. Por exemplo, na Matriz de Caminha, numa casa do século XV em Bruniquel (figura 5) e na Igreja de St Pierre de Dreux (figura 6).

04 Gárgula. Sé da Guarda.

04 Gárgula. Sé da Guarda.

Estas gárgulas de rabo ao léu têm ar de se borrifar para o comum dos mortais. A fazer fé na alquimia grotesca, fertilizam-nos. A cartografia simbólica do corpo humano desvaloriza o baixo (os pés), o posterior (as costas) e o interior (as entranhas). Estas gárgulas perfazem um cúmulo grotesco: baixeza traseira incontinente.

05 Gárgula. Casa do séc. XV. Bruniquel. França

05 Gárgula. Casa do séc. XV. Bruniquel. França

06 Gárgula. Igreja de St Pierre de Dreux. França

06 Gárgula. Igreja de St Pierre de Dreux. França

07 Gárgula. Catedral de Amiens. França.

07 Gárgula. Catedral de Amiens. França.

O que significa tamanha vulgaridade numa igreja? O fenómeno não é inédito. As danças macabras atemorizam tanto as igrejas como os cemitérios dos sécs. XV e XVI. Nos  edifícios beneditinas, multiplicam-se os sátiros e as carrancas. O próprio diabo é presença habitual na casa do Senhor.

08 Gárgula. Catedral de Fribourg, Brisbau. Alemanha.

08 Gárgula. Catedral de Fribourg, Brisbau. Alemanha.

Michel Maffesoli fala em homeopatia do mal, senão da morte. Mikhail Bakhtin, convoca os interstícios do lado sombrio da criação, o da potência dionisíaca. Entretanto, imunes a hermenêuticas, as gárgulas defecam chuva, a fonte da vida, a seiva do húmus.

 

Michel Maffesoli

Michel Maffesoli e Muniz Sodré. Seminário O Trágico e o Grotesco no Mundo Contemporâneo. Tibães, 2005,

Michel Maffesoli e Muniz Sodré. Seminário O Trágico e o Grotesco no Mundo Contemporâneo. Tibães, 2005,

Michel Maffesoli faz hoje anos. Foi meu professor na Sorbonne em 1981 e contribuiu para a minha apetência pelo estudo do imaginário. Confesso que é uma das raras pessoas a quem invejo a qualidade da escrita e do discurso.

Seguem três ligações, algumas em jeito de prenda digital:

– Uma entrevista recente de Michel Maffesoli (11/11/2013): Narcisses. Sommes-nous la géneration la plus obsedée par ses défauts physiques de l’histoire de l’humanité?http://www.atlantico.fr/decryptage/narcisses-sommes-generation-plus-obsedee-defauts-physiques-histoire-humanite-michel-maffesoli-895382.html

– Um vídeo, O Desconcerto do Mundo, concebido para um seminário, O trágico e o Grotesco do Mundo Contemporânio (Tibães, 2005),  com a participação de Michel Maffesoli: http://tendimag.com/?s=desconcerto+do+mundo;

As Duas Faces, Imagens de Cristo, um vídeo talhado para quem reconhece o valor e o alcance das imagens religiosas, tema que abordei parcialmente na comunicação “Le Mélange Insensé; De l’enluminure au digital”, nas jornadas Socialité Postmoderne (Sorbonne, Junho 2011), organizadas pelo Centre d’Etude sur l’Actuel et le Quotidien, dirigido por Michel Maffesoli: http://tendimag.com/?s=duas+faces.

Michel Maffesoli, José da Silva Lima e José Bragança de Miranda. Seminário O Trágico e o Grotesco no Mundo Contemporâneo. Tibães, 2005.

Michel Maffesoli, José da Silva Lima e José Bragança de Miranda. Seminário O Trágico e o Grotesco no Mundo Contemporâneo. Tibães, 2005.