Para sempre jovem

Há ano e meio que não ia a Moledo, não via o mar, não apanhava tanto sol, não bebia um sumo de laranja numa esplanada, não esperava encontros inesperados, não almoçava um arroz de tamboril tão saboroso e não dava tantos passos. Afinal, ainda pareço um hospedeiro e um peregrino da vida.
A fonte do sucesso

O Olimpo existe! Os vendedores de sonhos mostraram-mo. Chama-se GOAT camp (GOAT: Greatest Of All Times). É habitado por humanos lendários. De hipérbole em hipérbole, bebem poções de energia e talento. Se tem sede do impossível, beba Gatorade!
Tudo isto me envelhece. Aos sessenta anos? Há algumas décadas atrás, sem a mínima dúvida. Em Portugal, a esperança de vida masculina era, em 1960, 60,7 anos; antes do 25 de Abril, em 1974, era 64,8 anos. Convoco o paradoxo de Vilfredo Pareto:
Seria bastante difícil, falando de homens, deixar de utilizar as expressões, jovem, velho, se bem que ninguém possa dizer em que momento preciso termina a juventude e começa a velhice. A linguagem corrente é obrigada a substituir diferenças quantitativas reais por diferenças qualitativas arbitrárias” (Pareto, Vilfredo, Manual de Economia Política. 1ª ed. 1906. São Paulo, Editora Nova Cultural Ltda., 1996, p. 233).
Estou naquela idade em que crescem as saudades e diminuem as esperanças. Não me venham com a história da terceira adolescência! Adolescente, andava de bicicleta, agora, temo a cadeira de rodas. Não existe elixir da juventude nem fonte da vida. Jovens, somos jovens até ao túmulo para a Segurança Social.
A semana passada, pedi ao funcionário do bar uma bebida que dispensasse copo ou palhinha. Sugeriu-me Gatorade. A aula terminava às 22 horas; à meia-noite, ainda estávamos a discutir o Beijo de Klimt. A Tina Turner terá bebido Gatorade? Parece. De qualquer modo, simplesmente The Best.
Abstenção
Não vale a pena? Tens mais que fazer? És um original? Não és um parafuso numa engrenagem? Nem um nada na massa? São todos iguais? Não os conheces de nenhum lado? Pois, não votes, outros o farão por ti. Mais do que imaginas! Mas não vale a pena insistir. Nunca se sabe o que se ganha com uma cruz num quadrado.
Desconversemos! Por que motivo o anúncio se dirige a um grupo etário, os jovens? Mesmo que o abstencionismo seja maior entre os jovens, isso não justifica uma discriminação cívica, o dedo apontado à maneira do Tio Sam. Mas o que mais me incomoda no anúncio é a oposição entre jovens, que não votam, e velhos, que votam mal. Senso comum, tão comum quanto perverso. Como diria o cónego Remédios, não havia necessidade.
Anunciante: Acronym. Título: Dear young people, don’t vote. Agência: Nail Communications. Direcção: Lee Beckett. Estados Unidos, Setembro 2018.
Tantas maneiras de dizer que te amo
Comunicar o amor não é uma arte, é a arte. O anúncio Label of Love, da marca Monoprix, é de uma simplicidade e de uma eloquência raras.
Marca: Monoprix. Título: Label of Love. Agência: Rosapark Paris. França, Maio 2017.
Querendo a memória, o mundo é grande. Há muitas canções que dizem o amor. Entre as mais célebres constam I Just Called To Say I Love You, do Stevie Wonder, ou Hello, de Lionel Richie. Sou latino. Gosto de ser latino. Tenho ouvidos para outras músicas. Por exemplo, Te Voglio Bene Assai, uma canção de 1839, atribuída a Raffaele Sacco, na interpretação de Lucio Dalla.
Lucio Dalla. Te Voglio bene assai. Canção original: 1839.
Ou Aranjuez, Mon Amour, com música de Rodrigo, escrita por Richard Anthony e interpretada por Amália Rodrigues.
Amália Rodrigues. Aranjuez, mon amour. 1968.
Ou Te Quiero, Te Quiero, de Nino Bravo, um famoso cantor espanhol vítima de um acidente de viação em 1973, com 28 anos.
Nino Bravo. Te Quiero, Te Quiero, álbum Te Quiero Te Quiero, 1970.
As mercadorias do amor
L’amour consiste à être bête ensemble (o amor consiste em ser estúpido em conjunto; Paul Valéry, Monsieur Teste, 1896).
Um anúncio centrado numa relação heterossexual! Um romance num mundo recheado de mercadorias. L’amour, l’amour, l’amour… A música é meio anúncio. Uma pequena amostra de romantismo francês.
Marca: Intermarché. Título: L’amour, l’amour, l’amour. Agência: Romance. Direcção: Katia Lewkowicz. França, Março 2017.
Francis Lai. Un homme et une femme. Claude Lelouch. Un Homme et une femme. 1966.
Horror pedagógico
De temps en temps, les Français me dépassent ! Hoje, vesti-me de crítico, como o actor de Stanislavski (A Construção da Personagem, ca. 1930). Revejo o anúncio Déja-vu 2, da Agence de la Biomédecine, e percebo cada vez menos. Trata-se de uma paródia dos filmes de terror de série B. Uma paródia obtusa de um género obtuso. De noite, na floresta, uma jovem expansiva e ingénua afasta-se do grupo e é vítima de uma série de facadas e machadadas desferidas por um serial killer. O público-alvo do anúncio são os jovens entre os 15 e os 25 anos, grupo suposto aterrorizar-se ou gozar com o anúncio. O assunto é, contudo, sério: a doação de órgãos e tecidos:
Dans le contexte de l’évolution de la réglementation sur le don d’organes et de tissus, l’Agence de la biomédecine renouvelle une prise de parole à destination des jeunes. Une prise de parole qui a pour objectif de continuer à les sensibiliser sur le sujet du don d’organes et de tissus, mais aussi à les informer sur la loi en vigueur, notamment concernant le principe méconnu du consentement présumé et les modalités d’expression du refus » (Agence de la Biomédecine).
Afigura-se-me que estamos perante um anúncio de consciencialização que aposta na circulação, porventura, numa “epidemia” viral. A extensidade sobrepõe-se à intensidade, l’effet au sujet. Esta opção é vulgar na publicidade de consciencialização. Propagar é o objectivo! E o disgusto é um bom mensageiro.
Para terminar, um pergunta tão mesquinha quanto perversa: naquele corpo feminino, coberto de golpes, sobra algum órgão apto para doação? Et voilà!
Anunciante: Agence de la Biomédecine. Título : Déjà-vu 2. Agência : DDB Paris. Direcção: Steve Rogers. França, Novembro 2016.
A juventude não tem idade
“Sem limites”! “Todos jovens”! “Com o potencial ao máximo”! Modernidade ou pós-modernidade? Pouco interessa. Certo é que Sister Madonna Buder é o máximo, o potencial ao máximo! E nós somos, quase como ela, o máximo em potência. Aliás, todos somos o máximo. Somos, por vocação, o que somos.
E a juventude, senhor? A juventude é cada vez mais sagrada. Já não é uma idade, mas um estado. Um estado de graça. Do máximo em potência para o potencial ao máximo, só falta atender ao chamamento e umas sapatilhas Nike. Coloquemos os olhos em Sister Madonna Buder. Uma referência, com uma carreira religiosa e desportiva notável. Jovem, muito jovem, aos 86 anos de idade.
Abençoado anúncio. Bem feito. É raro ver uma marca e uma agência tão afinadas.
Marca: Nike. Título: Unlimited Youth. Agência: Wieden + Kennedy Portland. Direcção: Max Malkin. USA, Agosto 2016.
O sabor dos sentimentos
A Coca-cola tem um novo slogan. Após sete anos a borbulhar felicidade, é a vez de Taste the Feeling (na campanha brasileira, “sinta o sabor”). Acabam de sair seis anúncios. Um acontecimento no mundo da publicidade. Ainda é cedo para tomar o pulso. A tendência aponta para os laços, os sentimentos e as sensações. O que atrai e o que separa as pessoas. O amor sucede à felicidade. Subsistem aspectos que pouco ou nada mudaram: no planeta Coca-cola só vivem jovens. São tão queridos! Tão gostosos! “So very tasty”. Os adultos ou não existem ou são dispensáveis.
Carregar nas imagens para aceder aos vídeos.
Marca: Coca-cola. Título: Supermarket. USA, Janeiro 2016.
Marca: Coca-cola. Título: Under pressure. Agência: Ogilvy & Mather. USA, Janeiro 2016.
A chave da juventude. O efeito George Clooney
Mencionei, há dias, o mito da eterna juventude (http://tendimag.com/2015/12/13/dar-vida-a-morte/). Não demorou a cair na rede um anúncio a preceito: Forever Young, da Volskwagen. Uma mostra de jovens quarentões. Qual é o segredo? Um novo elixir da juventude? O Volskswagen Polo?
Dando asas à curiosidade, quais são, no anúncio, os sinais exteriores de juventude? A aparência: corpo à Leni Riefenstahl e roupa à Hugo Boss. Os próximos: mulher e filhos adoráveis. Raça desportiva, homem muito homem e um Volkswagen Polo.
Num site argentino, o vídeo aparece com a seguinte mensagem: “Publicidad discriminatoria”: “Una publicidad discriminatoria que propaga estereotipos estandarizados y promueve la valoración personal positiva sólo por la belleza exterior” (https://www.youtube.com/watch?v=WMhBFlEXehE). Mas a discriminação não fica por aí, vai muito além da beleza exterior.
“Forever is our today”. Vale a pena recordar os Queen.
Para aceder aos vídeos, carregar nas imagens.
Marca: Volkswagen. Título: Forever Young. Agência: DDB (Argentina). Direcção: Lucian Podcaminsky. Argentina, Dezembro 2015.
Queen. Who wants to live forever. A kind of Magic. 1986.