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Inspiração

Coca-Cola. Masterpiece. Março 2023

Eis um anúncio que concebe uma inspiração engarrafada como nunca ninguém sonhou! Um rodopio de imagens e obras de arte numa odisseia vertiginosa. Este “masterpiece” da Coca-Cola estreou esta semana, no dia 6 de março.

Figuras que ganham vida, por exemplo, saem de quadros, é um motivo com antecedentes. É o caso do filme de animação Le roi et l’oiseau, iniciado nos anos cinquenta e terminado em 1980, realizado, em França, por Paul Grimault, ou, se a memória não me engana, dos Contos fantásticos de E.T.A. Hoffmann (1776-1822).

Marca: Coca-Cola. Título: Masterpiece. Agência: Blitzworks. Produção: Academy. Direção: Henry Scholfield. USA, março 2023

“An ice-cold bottle of Coca‑Cola journeys from canvas to canvas—starting with Andy Warhol’s 1962 Coca‑Cola and continuing to a refreshingly diverse and culturally rich mix of classic and contemporary paintings before ultimately landing in the hands of an art student in need of creative inspiration—in a new global campaign titled “Masterpiece”. / The latest expression of the “Real Magic” brand platform celebrates how Coca-Coca provides uplifting refreshment in moments that matter. The campaign’s creative centerpiece is a short film set in an art museum, where students are sketching select paintings on display. As one student appears uninspired, an arm from a painting reaches across the gallery to grab the Coke bottle from Warhol’s pop-art masterpiece. From there, it’s relayed from works including JMW Turner’s “The Shipwreck”, Munch’s “The Scream” (re-colored lithograph) and Van Gogh’s “Bedroom in Arles” before finally landing with Vermeer’s “Girl with a Pearl Earring”, whose subject opens the bottle for the student in need of inspiration and refreshing upliftment. / In addition to these universally recognized paintings from the past century, the film bridges the worlds of classical and contemporary art by featuring work from emerging creators from Africa, India, the Middle East and Latin America” (Coca-Cola).

Lista de obras de arte contempladas no anúncio:

00:14 Divine Idyll  –  Aket, 2022
00:24 Large Coca-cola  –  Andy Warhol, 1962
00:30 The Shipwreck  –  Joseph Mallord William Turner, 1805
00:38 Falling in Library  –  Vikram Kushwah, 2012
00:43 The Blow Dryer  –  Fatma Ramadan, 2021
00:45 Scream  –  Munch, Edvard, 1895
00:48 You Can’t Curse Me  –  Wonder Buhle 2022
00:56 The Bedroom (Bedroom in Arles)  –  V. van Gogh, 1889
01:04 Artemision Bronze  –  Unknown (Greek), 460BC
01:11 Natural Encounters  –  Stefania Tejada, 2020
01:22 Drum Bridge and Setting Sun Hill  –  Hiroshige, 1857
01:29 Girl with a Pearl Earring  –  Johannes Vermeer, 1665

Estigma capilar

Fotografia de Robert Capa. Chartres, 18 de agosto de 1944. Logo após a libertação da cidade, raparam o cabelo a uma mulher francesa que teve um filho com um soldado alemão como sinal de humilhação

Proveniente da Alemanha, país que tendemos a associar alguma contenção e ponderação, o anúncio “Hans”, da empresa de cabeleireiros Headhunter, excede-se. Propõe uma paródia ousada, senão atrevida, de uma realidade sensível: as campanhas de consciencialização para a inclusão de crianças com deficiência. Num aspeto o anúncio não deixa de estar certo: os cabelos podem funcionar como estigma, contagiando e desvalorizando a pessoa no seu todo. Recorde-se que, no final da Segunda Grande Guerra, nos dias imediatos à libertação da França, a população rapou o cabelo aos “colaboracionistas” com o regime nazi, expondo-os em cortejos degradantes (ver Violência e Humilhação: https://tendimag.com/2016/01/14/violencia-e-humilhacao/).

Marca: Headhunter. Título: Hans. Agência: Philipp & keuntje. Direção: Laszlo Kadar. Alemanha, 2000.

Riso e Maldade

ementicons-bad-happy-1024x573O riso é malicioso? Só nos rimos do mal dos outros? Com maldade? Quanto mais insólita for a situação? Em grupo? Há anúncios que convocam esta maldade. No Tendências do Imaginário, são às dezenas. Nalguns casos, o riso é franco, noutros, corrosivo. Este anúncio, Introducing Bad Happy, da Mentos, integra uma série, mentos ementicons, todos com o mesmo sentido de humor.

Marca: Mentos. Título: Introducing Bad Happy. Agência: BBH London. Direcção: Mathew Pollock. UK, Fevereiro 2015.

Selfie Mania

Selfie Van Gogh 2

Na minha língua, Selfie é nome de animal. Selfie! Selfie! Selfie! Noutras línguas, pode significar uma travessia electrónica à volta do umbigo. O anúncio tailandês Selfie Mania navega nestas águas. Com humor oriental: pictórico, absurdo, insólito e, por vezes, sinistro. Em suma, grotesco.

Marca: Huawey. Título: Selfie Mania. Agência: Saatchi & Saatchi, Thailand. Direcção: Apiruk Pangseepirom. Tailândia, Maio 2014,

O mundo é cómico e a vida é bela…

MaltêteOs amigos não se cansam de me mimar com prendas digitais. Sou um homem de sorte. A Germana acabou de me enviar uma apresentação com  fotografias de René Maltête (1930-2000) focalizadas no insólito das coincidências e das incongruências fortuitas que animam a experiência banal. Já tinha visto, mas é à segunda que se gosta de verdade. Por acréscimo, vale a pena ouvir Jean Ferrat (1930-2010). O mundo é cómico e a vida é bela. Dizem eles…

Para descarregar a apresentação (5 MB): René Maltête. Fotografia.

Humor estranho

LUX-Save-Your-SkinOs génios também fazem obras de arte disfarçadas de anúncios publicitários. É o caso do alemão Andreas Bruns. A sua página pessoal é parca em anúncios (http://www.andreasbruns.com/), mas cada um tem um toque especial. Selecionei dois. Um terceiro, da Mercedes-Benz, The Journey, já foi publicado no blogue: http://tendimag.com/2013/01/10/perdidos-e-achados/. Save your skin, para a Lux, e Breathtaking, para a obsAIRve, seguem um esquema semelhante: um compasso longo que termina em sobressalto. No primeiro anúncio, fica-se com a sensação de assistir a um teaser de um filme terror já visto. Os últimos dez segundos encarregam-se de tudo subverter: o agressor escorrega no sabonete que escapa das mãos da vítima. No segundo anúncio, duas crianças sustêm longamente a respiração acabando por colocar, em catástrofe, uma máscara de gás num cenário inesperadamente apocalíptico. Em ambos os anúncios, a marca aparece durante esta turbulência final que nos deixa “sem respiração”. Trata-se de um humor grotesco, estranho e corrosivo, com raízes fundas na arte e na literatura alemãs. Remonta, pelo menos, ao movimento Sturm und Drang (tempestade e ímpeto; do séc. XVIII) partidário da Empfindung (emoção que suplanta a razão). Mikhail Bakhtin e Wolfgang Kayser, os principais teóricos do grotesco, dedicaram especial atenção a este movimento.

Marca: Lux. Título: Save your skin. Agência: Filmakademie Baden-Württemberg. Direção: Andreas Bruns. Alemanha, Outubro 2013.

Sobra uma pergunta: como é que um vídeo insólito e desconcertante contribui para a compra de sabonetes Lux? Será que um conteúdo desagradável pode, devidamente eufemizado e contextualizado, cativar? Será que o segredo reside mais na forma do que no conteúdo? Importa resgatar uma longa tradição, acentuadamente alemã, de pesquisa das formas, patente em Heinrich Wölfflin, Georg Simmel, Georgy Lukacs, Erwin Panofsky ou Walter Benjamin. Para abordar os anúncios publicitários enquanto formas simbólicas, convém dar a mão a autores com Mikhail Bakhtin, Marshall McLuhan, Roland Barthes, Gilbert Durand, Jean Baudrillard, Umberto Eco, Gilles Deleuze ou Omar Calabrese.

Anunciante: obsAIRve. Título: Breathtaking. Agência: Filmakademie Baden-Württemberg. Direção: Andreas Bruns. Alemanha, Dezembro 2012.

Não é nenhuma aberração uma pessoa deixar-se seduzir pelo tétrico e pelo estranho. Os filmes dedicados ao terror e ao absurdo obtiveram, desde os primórdios do cinema, sucessos de bilheteira: Nosferatu, o Vampiro, de Friedrich Munau, de 1922; o Drácula, de Tod Browning, de 1931; do mesmo realizador, Freaks, de 1932; o primeiro Frankenstein foi produzido em 1910 por Thomas Edison: em 1931 surge a versão clássica de James Whale, com Boris Karloff; por último, Um Cão Andaluz, filme surrealista de Luis Buñuel e Salvador Dali, é publicado em 1929. Na actualidade, os filmes do género banalizaram-se. Em boa verdade, o tétrico e o sinistro tanto nos repelem como nos atraem.

O Futuro da Carne

Prada. The Future of FleshA publicidade pode ser arte? Sem precisar de ser agradável? A moda confirma-se como segmento de anúncios de alta costura.

Marca: Prada. Título: The Future of Flesh. Agência: Logan & Sons. Direção: Luke Gilford. Outubro 2013.

Guiar o olhar

SNCR Micro Prix TGV SauterelleNesta campanha da SNCF, Micro Prix TGV, cada anúncio abre com uma bela sequência de imagens de um pequeno animal: gafanhoto, joaninha, louva-a-deus e rã. Apelativas, estas imagens prendem o olhar, conduzindo-o até a um inesperado letreiro com o preço de um bilhete de comboio. Cada anúncio não é longo (cerca de 35 segundos), mas produz um efeito de duração notável, e aprazível. Neste conjunto de aspectos, os anúncios são eficazes. Já a ponte entre o infinitamente pequeno dos animais e o infinitamente pequeno dos preços, parece-me, como dizem os franceses, tirée par les oreilles.

Anunciante: SNCF Micro Prix TGV. Título: La Sauterelle. Agência TBWA Paris. Direção: Jérôme Raynaud. França, Setembro 2013.

Anunciante: SNCF Micro Prix TGV. Título: La Coccinelle. Agência TBWA Paris. Direção: Jérôme Raynaud. França, Setembro 2013.

Anunciante: SNCF Micro Prix TGV. Título: La Mante. Agência TBWA Paris. Direção: Jérôme Raynaud. França, Setembro 2013.