Unanumo, Laranjeira e Valentine

República 2Há ideias com que concordamos, e logo esquecemos. Há outras com que discordamos, mas mantemos o diálogo. Um aluno Erasmus fez um trabalho sobre Miguel de Unanumo. Relembrou-me a visão deste filósofo espanhol, reitor da Universidade de Salamanca, sobre Portugal:

“Portugal é um povo triste, e é-o até quando sorri. A sua literatura, incluindo a sua literatura cómica e jocosa, é uma literatura triste. Portugal é um povo de suicidas, talvez um povo suicida. A vida não tem para ele sentido transcendente. Desejam talvez viver, sim, mas para quê…” (Portugal Povo de Suicidas, Lisboa, Letra Livre, 2010).

Chegados aqui, o melhor é não parar:

“A paixão trá-lo à vida, e a própria paixão, consumido o seu alimento, leva-o à morte. Hoje o que lhe resta? Dentro de uns dias, em 1 de Dezembro, celebrar-se-ão as festas da restauração da sua nacionalidade, de ter sacudido a soberania dos Filipes da Espanha. No dia seguinte voltarão a falar de bancarrota e de intervenção estrangeira. Pobre Portugal!”

Escritas em 1908, estas palavras ecoam na consciência. Prefiro, mesmo assim,  “a melancolia venenosa” de Manuel Laranjeira em carta endereçada em 1908 ao mesmo Miguel de Unanumo:

Em Portugal chegou-se a este princípio de filosofia desesperada — o suicídio é um recurso nobre, é uma espécie de redenção moral. Neste malfadado país, tudo o que é nobre suicida-se; tudo o que é canalha triunfa (…) Às vezes, em horas de desânimo, chego a crer que esta tristeza negra nos sobe da alma aos olhos; e, então, tenho a impressão intolerável e louca de que em Portugal todos trazemos os olhos vestidos de luto por nós mesmos” (Espinho, Carta a Miguel de Unanumo, 1908).

Uma lástima que a internet não existisse na alvorada do século XX. O sentimento trágico de Unanumo seria menos trágico e a melancolia venenosa de Laranjeira menos melancólica. Esta Valentine redime a mátria portuguesa. Teriam cantado um País feliz, feliz, feliz… como agora, com o balanço dos últimos dois anos do governo da República.

I am Valentine. Acriz: Diana Nicolau. Produção: Diffuse Studios. Portugal, Fevereiro 2014.

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One response to “Unanumo, Laranjeira e Valentine”

  1. Rasgos Artes Beatriz Martins says :

    È,sem perspetivas, a “felicidade”, resume-se ao prazer imediato, como substituição!

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