Dar corda ao desejo
Já tinha saudades da libido em estado puro!
O abraço ao divino: a experiência pessoal e social da festa (texto ilustrado)
“A festa é um excesso permitido, ou melhor, obrigatório” (Freud, Sigmund, 1913, Totem e Tabu).
As festas circunscrevem-se no tempo e no espaço. “A festa tem uma data e é uma data” (SCZARNOWSKI, Stefan & Hubert, Henri, 1919, Le culte des héros et ses conditions sociales, Paris, F. Alcan): a festa de S. Lourenço é no dia 10 de Agosto (tem uma data); 10 de Agosto é o dia de S. Lourenço (é uma data); para quem é devoto de S. Lourenço, o dia 10 de Agosto é dia santo.
A origem da maior parte das festas é remota e rural. A sua configuração altera-se em função do calendário agrícola. Consumadas as colheitas, por altura do S. Miguel, a natureza mostra-se, no outono e no inverno, menos generosa. Quem não tem pão no celeiro, porco na corte e vinho na adega, passa mal. As famílias recolhem-se e o convívio afrouxa. Neste contexto de carência, as festas apelam à coesão social e à generosidade. As festas de São Martinho, de São Nicolau, do Natal, dos Reis ou de São Sebastião caracterizam-se todas pela ideia da dádiva e de partilha. São Martinho reparte a capa, a caridade de S. Nicolau é proverbial, o Menino nasce na pobreza, cantam-se de porta em porta as janeiras pedindo as sobras da época natalícia e S. Sebastião benze banquetes gigantescos.
No verão, no auge das colheitas, as festas querem-se de excesso e abundância. Lúdicas e efervescentes, transvasam do adro para o terreiro e, do terreiro, para os (des)caminhos. Algumas festas celebram o poder das instituições, como o Corpo de Deus, outras, a potência popular, como o Santo António, o São João e o São Pedro.
Entre a melancolia do inverno e a euforia do verão, intercalam-se o Carnaval e a Páscoa. O Carnaval enterra o velho, a austeridade invernal, e prenuncia a renovação da natureza e da vida coletiva que a Páscoa, a seu tempo, celebra. O reforço dos laços sociais na Páscoa não é o mesmo das festas do inverno. No inverno, governam-se as reservas, o passado; a Páscoa é compassada pela promessa; mobilizam-se as pessoas e os recursos, semeia-se a abundância futura. Os novos tempos são mais de “amaiantes”[i] do que de nicolinos, mais milho que pinheiro.
Mito ou realidade, as sociedades ditas rurais esfumaram-se. E as festas mudaram. Algumas viram-se para os turistas e os forasteiros. São “festas extrovertidas”. Notável foi o ajustamento do calendário das festas ao regresso sazonal dos emigrantes. Muitas festas transitaram para o verão. Com o decréscimo de emigrantes em férias, algumas festas perderam um pouco de tudo: raízes, tronco, ramos e folhas.
A duração de uma festa pode extravasar os dias programados. Existem festas que começam antes e acabam depois: bailes, música, sorteios, quermesses, decoração… No início do século XX, a Romaria d’Agonia, por volta do dia 20 de Agosto, animava Viana do Castelo desde a primeira barraca a instalar-se, dias antes, até à última a desmontar-se, no início de Setembro (Martins, Moisés, Gonçalves, Albertino, Pires, Helena, 2000, A Romaria da Srª da Agonia, Viana do Castelo, Grupo Desportivo e Cultural dos Trabalhadores dos Estaleiro Navais de Viana do Castelo, p. 29).
Mas não são estas dimensões do tempo que desejo abordar. Cíclicas, as festas evoluem em tempos e espaços extraordinários. O início da festa é estrondosamente anunciado: foguetes, paradas, bombos ou arruadas inauguram a suspensão da ordem e a abertura dos festejos. Uma derradeira salva assinala o regresso à normalidade. Entretanto, vivencia-se uma experiência extraordinária e numinosa. O divino aproxima-se dos seres humanos. O sagrado e o profano exacerbam-se. A presença do sagrado intensifica-se, por um tempo, nos espaços demarcados (com bandeiras, arcos, iluminação). Se o divino se aproxima do humano, o humano expõe-se ao divino, por exemplo, através da oração, das promessas e das penitências. Acredita-se que, no período da festa, no devido local, o santo é mais milagreiro. Em Cavez, assegura-se que a fonte sulfurosa de S. Bartolomeu tem mais cheiro e faz mais milagres no dia do santo (Gonçalves, Albertino & Gonçalves João, 2014, A Festa de S. Bartolomeu de Cavez: https://tendimag.com/?s=bartolomeu). Na festa de S. Tiago das Bichas, a ocasião também era única. As bichas (sanguessugas) escolhiam o dia da sua intervenção milagrosa: “Há ao pé desta igreja um ribeiro, em dia de São Tiago, que é o orago, concorre muita gente a tomarem bichas para sararem de várias enfermidades. E é tradição antiga que só naquele dia se achavam no dito ribeiro que se chama de S. Tiago” (Capela, José Viriato, As freguesias do distrito de Braga nas Memórias Paroquiais de 1758, Braga, 2003, p. 224).
Cada festa traça a sua geografia simbólica. O romeiro pressente-o. Os lugares não ostentam o mesmo valor. Cresce desde o espaço de transição para o sagrado até à imagem do santo, passando pelo exterior e o interior do templo. À medida que se avança, os gestos e as palavras mudam, num sinal de respeito e devoção. Para trás, fica o mundo, a hora é de despojamento e oração. Importa tocar, beijar e agradecer ao santo. A devoção e a penitência procuram o sagrado: à volta da igreja, junto a um rochedo, na sombra de uma gruta ou na frescura de uma fonte. Onde o divino estiver, está o romeiro.
O acesso aos lugares sagrados pode ser especialmente cuidado. Alguns santuários têm escadórios: Nossa Senhora da Peneda, Bom Jesus do Monte, Nossa Senhora dos Remédios (Lamego) ou o Escadório das Virtudes, no Mosteiro de Tibães. Convidam os romeiros ao esforço da aproximação, pela ascensão, ao divino. Ladeados por esculturas e pinturas, alusivas, mormente, ao Calvário, estes escadórios propiciam uma ascese e uma catequese pela imagem. Mas, com a localização frequente das igrejas e das capelas no cume da paisagem, a ascensão sofrida dispensa escadórios. Por exemplo, o acesso à capela de São Romão no topo da Citânia de Briteiros é tão íngreme e inóspito que supera qualquer escadório em termos de sacrifício.
Nas igrejas, os devotos aproximam-se dos santos. Este é o magnetismo geral. Mas assim como, na lenda, Nossa Senhora da Orada se esgueirava todos os dias da capela para acudir às vítimas da peste em Riba do Mouro (Campelo, Álvaro, Lendas do Vale do Minho, Valença, Associação de Municípios do Vale do Minho, 2002), a santidade pode sair da igreja para se aproximar das pessoas. Durante a procissão, o santo irradia a sua aura sagrada e abençoa o território. A procissão de S. Sebastião das Papas, nas freguesias de Samão e Gondiães, é um bom exemplo (Gonçalves, Albertino & Gonçalves, João, 2013, “Entre o Céu e a Terra: Festas e Romarias de Cabeceiras de
Basto”, in Cabeceiras de Basto: História e Património, Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto, 2013, p. 188-203). Detém-se para o santo benzer a broa e as papas para o banquete. Consta que a broa benzida, milagrosa, não apodrece. Testemunho de que o divino e o humano se aproximam reciprocamente, na referida procissão, S. Sebastião, o santo, é apeado para ser beijado pelos devotos. Outras procissões percorrem a paróquia, por exemplo, a procissão de velas, mas a mais sagrada e a mais abrangente é o compasso pascal. O beijo à imagem de Cristo, lugar a lugar, casa a casa.
A cartografia da festa é móvel. Pode mudar de ano para ano, de dia para dia e, até, de hora para hora. O valor e o significado do espaço mudam tal como muda a relação entre o profano e o sagrado, ora distantes, ora encostados, ora justapostos. À noite, durante o arraial, o profano expande-se. De dia, a procissão dissemina, por um tempo, o esplendor do sagrado a toda a paróquia.
A relação entre o profano e o sagrado é um tema recorrente e polémico. Ao longo da história, a posição da Igreja tem oscilado, consoante os contextos e as políticas. A tendência vai no sentido de não admitir o profano nas barbas do santo, adotando-se as medidas estimadas necessárias. No final dos anos 1920, o combate ao “sol pagão” esteve ao rubro. Na Festa d’Agonia, ameaçou-se silenciar os sinos. O problema não é apenas físico, corporal. A distância visual e a distância auditiva também contam. Os sinos, os foguetes, a música e os altifalantes são intrusivos e controversos. De ambas as partes.
Não é apenas a relação entre o sagrado e o profano que condiciona a dinâmica das festas. Além do clero, muitas entidades intervêm na programação das festas: a confraria, a comissão, as organizações e as associações locais… Cada um com os seus interesses e as suas perspetivas. A Festa d’Agonia, na viragem do século XIX para o século XX, constitui um caso exemplar (Martins, Moisés, Gonçalves, Albertino, Pires, Helena, 2000, A Romaria da Srª da Agonia, Viana do Castelo, Grupo Desportivo e Cultural dos Trabalhadores dos Estaleiro Navais de Viana do Castelo, p. 21-58).
Quem faz a festa é o povo. Não organiza, nem programa, nem executa, mas faz a festa. Dá-lhe seiva, corpo e alma. Sem povo, não há festa. As festas não morrem por falta de celebração ou de espetáculo, agonizam por falta de afluência. Oferecendo-se a festa como uma cristalização identitária da comunidade, assevera-se preocupante ver as festas e os lugares sem gente, a apagar-se. Mas o que mais surpreende não é o desaparecimento desta ou daquela festa, é a resiliência das populações e a sobrevivência das festas, a contracorrente do esvaziamento demográfico e da desvitalização social. É certo que o esvaziamento e a desvitalização são, em parte, compensados pela população flutuante, que tende a aumentar nos períodos festivos. O fenómeno revela-se, mesmo assim, notável. A fazer fé nos censos da população, em cinquenta anos, entre 1960 e 2011, a população de Castro Laboreiro decresceu de 1 941 para 540 residentes, reduzindo-se para cerca de um quarto. Por sua vez, entre 2001 e 2011, em apenas dez anos, o valor do índice de envelhecimento duplicou, subindo de 640 idosos por 100 jovens para 1 561 idosos por 100 jovens (17 jovens até 14 anos e 266 idosos com 65 e mais anos). Em 2011, metade (49,3%) da população residente tinha 65 ou mais anos de idade. Estes números não impedem que, com mais ou menos gente, a festa se faça. Na freguesia de Castro Laboreiro ocorrem, concentradas no verão, 11 festas religiosas: 2 em Julho, 5 em Agosto e 4 em Setembro. Em média, uma festa por semana! (União das Freguesias de Castro Laboreiro e Lamas de Mouro: http://www.castrolaboreiro-lamasdemouro.com/?m=festas&id=2703).
A festa é um negócio, que contribui para a economia local, incluindo a Igreja. Para além da salvação das almas, convém cuidar da satisfação dos corpos. A realização de uma festa envolve uma série de empresas, profissões e atividades convocadas: ornamentação, pirotecnia, publicidade, ex-votos, animação, som, iluminação, montagem de estruturas, roupas, bandas de música, música popular, fanfarras, ranchos folclóricos, quermesses, abarracamento (comes e bebes, brinquedos, jogos), restauração, hotéis, comércio… No auge das férias dos emigrantes, as festas de Melgaço foram, certamente, um bom negócio. Algumas festas desempenham um papel económico importante como mercado e plataforma catalisadora de toda uma região. É o caso da Feira e Festas de S. Miguel de Refojos.
Quem faz a festa é o povo. A multidão, o movimento, a poeira, o barulho, a iluminação e as emoções. O excesso no sacrifício e no prazer. O muito comer e o muito beber. Gritar, em vez de falar, para vencer a algazarra. A festa consta entre as mais humanas das obras humanas. Humano o profano, humano o sagrado. Na missa, na procissão e nos bailes, o povo exprime-se como corpo coletivo… Com recalcamentos, obsessões, sonhos, fantasmas e a sua parte de sexualidade e violência.
A festa funciona, simultaneamente, como catálise e catarse. Em noites de atrevimento, vigiar os jovens nos bailes era uma missão incontornável. Tantos namoros começaram em festas. Era uma preocupação. Quando o arraial pendia para o dionisíaco, os pais fechavam as filhas em casa. Por exemplo, na noite de São Bartolomeu de Cavez. Libertado pelo santo, “o diabo andava à solta”. A sexualidade e a violência costumam dar as mãos. Os mais velhos entusiasmam-se a recordar as refregas com o pau nas festas das freguesias vizinhas. Na excitação e na embriaguez reinante, qualquer rastilho entornava o caldo. Os rastilhos mais correntes usavam chapéu ou saias. Em algumas regiões, os beligerantes aprazavam o ajuste de contas para os dias ou, de preferência, as noites de determinada festa. Assim acontecia em Ribeira de Pena, Mondim de Basto e Cabeceiras de Basto com a festa de São Bartolomeu. Drena-se violência para a festa como se a violência endógena não bastasse. No conto “Como ela o amava” (Noites de Lamego, 1863), Camilo Castelo Branco descreve um confronto trágico, de que resultaram duas mortes, uma disputa por causa de uma mulher, na ponte de Cavez. Sublinhe-se, por último, que muitas festas ritualizam e encenam a violência. Atente-se, por exemplo, no martírio dos Santos Marroquinos, em Paderne, ou na guerra entre bugios e mourisqueiros, no S. João de Sobrado. Nestes casos, a própria festa incorpora a violência. [Carregar na imagem para aceder ao vídeo seguinte e ligue o som].
Não obstante o abraço divino, a utopia da igualdade, a sexualidade e a violência, quem entra pequeno na festa pequeno sai. A festa não esbate as desigualdades, espelha-as. Na competição dos candidatos à organização, na escolha dos mordomos, na publicitação altifalada das esmolas, nos leilões, no alinhamento das procissões, nas assimetrias do território… As festas são obra humana. Crescem, florescem e definham. Algumas desaparecem ou atrofiam por decisão administrativa. A Festa dos Tolos e a Festa do Burro, ambas medievais, não resistiram às reformas da Igreja. Por sua vez, o Corpo de Deus, outrora a mais imponente das procissões, ficou, de censura em censura, reduzida ao esqueleto. Sobreviveu a Coca, em Monção, bem como o Baile dos Ferreiros, em Penafiel. Hoje, os ventos sopram favoráveis às festas laicas. Algumas festas religiosas extinguem-se. Na maioria dos casos, não falta a devoção mas o público. Artes do envelhecimento e da desertificação. Dissipa-se o dia do santo, perde-se um ramo da árvore da comunidade. Uma árvore a que cortaram um ramo sobrevive, mas não é a mesma. E não perde pouco, se entendermos a festa como uma forma de “instituição imaginária da sociedade” (Castoriadis, Cornelius, 1975, L’Institution imaginaire de la société, Paris, Seuil). Não é irrelevante.
Escreve François Rabelais (Gargantua, 1534) que “o riso é apanágio do homem”. A festa, também! Até nas condições mais adversas, nas guerras ou nas crises, o ser humano não esquece a festa.
[i] Grupos de agricultores que se associavam para organizar e calendarizar as lavouras. Cada casa contribuía consoante o que possuía: junta de bois, ferramentas, mão-de-obra. Era costume chamar-se “amaiantes” aos participantes destes grupos.
Períodos de insónia
A menstruação revela-se como um dos principais pretextos, materiais e simbólicos, da dominação masculina. A este respeito, falta percorrer um longo e espinhoso caminho, mormente ao nível do imaginário. A Libresse, Bodyform no Reino Unido, tem ousado alguns passos. No anúncio Blood Normal (2017), é a primeira marca a assumir o vermelho do fluxo menstrual, rompendo com a tradição, sublimada, em azul ou verde: “periods are normal. Showing them should be too” (ver Coisa Ruim: https://tendimag.com/2017/10/26/coisa-ruim/). No ano seguinte, 2018, o esplêndido, desinibido e divertido anúncio Viva la Vulva empenha-se na valorização estética da genitália feminina (ver Vulvas e Pirilaus: https://tendimag.com/2018/12/04/vulvas-e-pirilaus/).
O anúncio #Periodsomnia, uma peça de “arte digital” impressionante, prossegue a campanha, “que visa erradicar tabus e vergonha em torno das experiências íntimas das mulheres”, agora com incidência empática nas consequências quotidianas da menstruação, designadamente ao nível da qualidade do sono: “Uma nova pesquisa conduzida pela Libresse revela que, em média, as mulheres perdem 5 meses de sono ao longo da vida devido ao desconforto, à ansiedade e ao medo noturnos durante o período”. Trata-se de mais um caso de uma iniciativa de sensibilização motivada por um interesse próprio bem interpretado. Registe-se, por último, a tendência para o recurso a dados estatísticos para sustentar as mensagens de consciencialização.
Ciência portuguesa e guitarra espanhola
“Toda a nossa dignidade consiste, pois, no pensamento (…) O homem é feito visivelmente para pensar; é toda a sua dignidade e todo o seu mérito; e todo o seu dever é pensar como é preciso” (Blaise Pascal, Pensamentos, 1670. Artigo XVIII. Grandeza do homem: XI e XII).
Estou a introduzir dados pessoais numa plataforma nacional de governo da ciência. Já não o fazia há muitos anos. Quando uma instituição me desilude aspiro à ignorância mútua. Nenhum contato, nenhuma solicitação, nenhuma necessidade. Prefiro o prejuízo à vénia. Espera-me canseira para alguns dias. “Pelo coletivo”, de proximidade, que respeito. Ressonâncias do poder. Acompanho a penitência com guitarra espanhola.
Falha técnica
Acordei desligado: uma falha no serviço da Internet. Razão acrescida para dedilhar os CD amontoados nos gavetões. Como de costume, retirei um punhado à sorte e escolhi um: What are you going to do with your life, dos Echo & The Bunnymen. Costumo escutar uma ou duas vezes e reter duas ou três música. Desta vez, não resisti a colocar o álbum completo. Não é fácil hierarquizar, possui uma marca própria e retalhá-lo seria um atropelo. Coloco-o para que alguém com uma falha na urgência quotidiana o possa apreciar
Envelhecimento e novas tecnologias
“Envelhecer é como escalar uma montanha: enquanto se sobe as forças diminuem, mas a visão torna-se mais ampla” (Ingmar Bergman).
Nunca foi tão notório o alcance das condições, das dinâmicas e das relações sociais na configuração do comportamento humano. No entanto, afigura-se-me que a Sociologia, como ciência e como profissão, marca passo. Trata-se, certamente, de um problema de miopia de quem não salta de congresso em congresso nem elege como bússola os rankings. Como uma miopia nunca vem só, quer-me também parecer que a polifonia e as viragens de pensamento tendem a ser cada vez mais lideradas por fundações e empresas privadas, com ou sem “responsabilidade social”. Ao redor, prevalece a cacofonia.
A “luta contra o envelhecimento” foi cruzada que conheceu melhores dias. Por que não ser velho e viver, francamente, a velhice? Opor-se ao envelhecimento parece-me um contrassenso e um imperativo pugnar pela qualidade de vida na velhice. A agência de publicidade colombiana Fantástica assume esta “nova” relação com a idade na campanha Te haces viejo, te llenas de contenido, para a Lenovo.
” En el marco del Día Nacional de la Juventud en Colombia, Fantástica y Lenovo presentan Te haces viejo, te llenas de contenido, que da un especial valor al rol que tiene la tecnología en los adultos mayores. La iniciativa apuesta por un segmento de gran potencial, pero poco explorado en el mercado.
De acuerdo con el informe Global Consumer Trends 2022 de Euromonitor, tras la pandemia, los adultos mayores pasaron de la resistencia a la confianza en la adopción de tecnología y uso de plataformas digitales. La necesidad de concretar diligencias personales, comunicarse con sus familiares o simplemente tener un espacio de entretenimiento para sí mismos, los llevó a involucrarse con las redes sociales y familiarizarse más con el uso de dispositivos móviles y computadores.
La campaña nace de entender a los adultos mayores como digital seniors, personas que no solo están aprendiendo las nuevas tecnologías, sino que también están aportando sus conocimientos para enriquecerlas.
Para Juan David Suárez, gerente de mercadeo de Lenovo Colombia, algunas marcas se dirigen al segmento de adultos mayores con mensajes basados en un posicionamiento un poco sesgado: se asume que son personas en retiro, con intereses en categorías solo de salud y poco activos. “Desde Lenovo tenemos otra visión; creemos en la resignificación de este segmento, entender que son fuentes activas y dinámicas de historia y patrimonio oral e intelectual” (https://www.adlatina.com/publicidad/preestreno-fantastica-y-lenovo-revalorizan-el-uso-de-la-tecnologia-por-parte-de-los-adultos-mayores).
O naufrágio da modernidade
Nada como uma boa ideia, de preferência simples e com impacto. Muito impacto. Mesmo que seja num ventre mole. Muito mole. A iniciativa Bihar, uma escultura hiper-realista de uma menina a afundar-se na ria de Bilbao, promovida pela instituição financeira BBK (Bilbao Bizkaia Kutxa), conseguiu uma gigantesca notoriedade gratuita no horário nobre da comunicação social ao nível planetário. Antecipando o futuro, em particular a ameaça das alterações climáticas, a campanha nos media, Leão de Prata em Cannes, desdobra-se num anúncio (2:15) e numa curta-metragem (17:01).