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Indolência extravagante

  • AS LENTAS NUVENS FAZEM SONO
  • Indolência aberrante
  • As lentas nuvens fazem sono,
  • O céu azul faz bom dormir.
  • Bóio, num íntimo abandono,
  • À tona de me não sentir.
  • E é suave, como um correr de água,
  • O sentir que não sou alguém,
  • Não sou capaz de peso ou mágoa.
  • Minha alma é aquilo que não tem.
  • Que bom, à margem do ribeiro
  • Saber que é ele que vai indo…
  • E só em sono eu vou primeiro.
  • E só em sonho eu vou seguindo.
  • (Fernando Pessoa, Poesias Inéditas, São Paulo, Poeteiro Editor, 2014)

De evento em evento, não me apetece pensar. Pasmo, escuto música e embalo os sentidos. Abandono puro. Não me serve qualquer música. Nem dos gavetões, nem das estantes, mas das raras e singulares, que releguei para as pastas de arquivo. Por exemplo, o folk psicadélico “esquisito” (weird) de Devendra Banhart, que, por sinal, adora Portugal. Conhece?

“O cantor norte-americano Devendra Banhart gostou tanto da recepção que obteve durante o “Festival para Gente Sentada”, realizado na cidade de Santa Maria da Feira, que decidiu homenagear a cidade nesta bonita canção interpretada em espanhol/castelhano” (Devendra Banhart encanta-se por “Santa Maria da Feira” (2005). Portugal através do mundo: http://portugal-mundo.blogspot.com/2007/11/devendra-banhart-encanta-se-por-santa.html).

Devendra Banhart. Santa Maria da Feira. Cripple Crow. 2005

Em 2020, regressou a Portugal para apresentar o álbum Ma. Segue a gravação da canção Is This Nice na Antena 3. O vídeo 4 retoma esta canção mas em versão estúdio.

Devendra Banhart. Is This Nice?. Ma. 2019. Ao vivo na Antena 3, Portugal, fevereiro 2020

Acrescento a interpretação acústica de Never Seen Such Good Things, um dos seus maiores sucessos.

Devendra Banhart. Never Seen Such Good Things. Mala . 2013. Ao vivo, L’Express, 2013
Devendra Banhart. Is This Nice. Ma. 2019. Versão estúdio.

Períodos de insónia

Libresse/Bodyform. Periodsonia. 2022

A menstruação revela-se como um dos principais pretextos, materiais e simbólicos, da dominação masculina. A este respeito, falta percorrer um longo e espinhoso caminho, mormente ao nível do imaginário. A Libresse, Bodyform no Reino Unido, tem ousado alguns passos. No anúncio Blood Normal (2017), é a primeira marca a assumir o vermelho do fluxo menstrual, rompendo com a tradição, sublimada, em azul ou verde: “periods are normal. Showing them should be too” (ver Coisa Ruim: https://tendimag.com/2017/10/26/coisa-ruim/). No ano seguinte, 2018, o esplêndido, desinibido e divertido anúncio Viva la Vulva empenha-se na valorização estética da genitália feminina (ver Vulvas e Pirilaus: https://tendimag.com/2018/12/04/vulvas-e-pirilaus/).

O anúncio #Periodsomnia, uma peça de “arte digital” impressionante, prossegue a campanha, “que visa erradicar tabus e vergonha em torno das experiências íntimas das mulheres”, agora com incidência empática nas consequências quotidianas da menstruação, designadamente ao nível da qualidade do sono: “Uma nova pesquisa conduzida pela Libresse revela que, em média, as mulheres perdem 5 meses de sono ao longo da vida devido ao desconforto, à ansiedade e ao medo noturnos durante o período”. Trata-se de mais um caso de uma iniciativa de sensibilização motivada por um interesse próprio bem interpretado. Registe-se, por último, a tendência para o recurso a dados estatísticos para sustentar as mensagens de consciencialização.

Marca: Libresse. Título: #Periodsomnia. Agência: AMV BBDO, London. Direção: Kim Gehrig. Reino Unido, julho 2022.

Desigualdade perante o sono

Ariel

A publicidade interessa-se pelas questões de género. Retomando os termos de Louis Althusser, a publicidade não inventa, nem descobre os problemas de género, reinventa-os e vulgariza-os. O anúncio indiano Share the Load é refinado e persuasivo. Algo paira no ar. Sente-se. A um ritmo lento e magnético. Tudo se precipita nos derradeiros segundos. O problema: a mulher tem falta de dormir; “71% das mulheres dormem menos do que os homens devido às ocupações domésticas”. E a solução: repartir as tarefas, partilhar a lavagem da roupa, sem esquecer Ariel, o terceiro elemento. Os anúncios orientais têm o dom de expressar a vida quotidiana sob uma luz mágica.

Marca: Ariel. Título: Share de Load. Agência: BBDO India. Direcção: Shimit Amin. Índia, Março 2020.

Papão

John. Moz the Monster. 2017

Quantas vezes não me cantaram, quantas vezes não cantei, esta canção de embalar:

“Dorme menino
Que aí vem o papão
Comer meninos
Que não dormem não.”

O meu menino chama-se
Fernando Meco João
É muito lindo e brincalhão.

“O meu menino está chorando
Com medo do papão,
Sossega, meu menino,
Que não te come, não.”

Segue o anúncio Moz the Monster, com a assinatura de Michel Gondry.

Marca: John Lewis. Título: Moz the Monster. Agência: Adam&eveDDB. Produção: Partizan. Direcção: Michel Gondry. Reino Unido, Novembro 2017.

Os carneiros contra-atacam

serta, mattress heistBasta de contar carneiros! Os colchões Serta fazem milagres. Um regalo de sono! Mas os carneiros não estão pelos ajustes. Fazem sabotagem e roubam os colchões. Basta de desemprego! Os carneiros foram criados para saltar nas nossas cabeças. Sem parar! Engraçado como a publicidade se apraz em tornar o bom em mau. Quer baralhar os nossos valores?

Marca: Serta. Título: Mattress Heist. Agência: Doner. Direção: Peter Peake. EUA, Março 2012.