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Filhos da Mãe: Les Enfoirés

“Les gens qui rêvent font des révolutions” (Les Enfoirés)

No bar do Instituto de Ciências Sociais, apenas os três funcionários. Com as memórias sentadas à minha volta, apetece-me sentir a nortada no rosto e a generosidade ao alcance dos dedos. Despeço-me rumo a Moledo. Caminho, pasmo e janto sardinhas com alface, tomates e pimentos colhidos na horta do Sr. João. No restaurante, apenas se ouve o zumbido da televisão que, como uma mosca, revolve o mesmo lixo: a comissão de inquérito para lamentar. Em casa, carrego baterias, as baterias da fé. Com os “filhos da mãe” (Les Enfoirés; motherfuckers).

Exemplo raro de generosidade, Les Enfoirés (http://www.enfoires.fr) é um coletivo de artistas criado em 1985 por Coluche com o objetivo de contribuir para a sua principal iniciativa de solidariedade: Les Restos du Coeur. Seguem quatro canções. Uma sequência com trinta interpretações dos Enfoirés está disponível no seguinte endereço: https://www.youtube.com/watch?v=XcmG2RZYxDs.

Coluche, por Catherine Wernette

Didier Barbelivien & Olympe & Stanislas / Les Enfoirés. Elle était si jolie (cover de Alain Barrière, 1963). 2014
Celine Dion & Maurane / Les Enfoirés. Quand on a que l’amour (cover de Jacques Brel, 1956). 1996
Les Enfoirés. Ta Main (cover de Grégoire, Toi+Moi, 2008). 2010
Les Enfoirés. Rêvons. 2023 Enfoirés un jours, toujours. 2023

Amor de filho

C.P. Group. Gratitude. Tailândia. 2018

Dispõe de seis minutos para comover o coração e expor a consciência? Promovida por uma cadeia de distribuição tailandesa, C.P. Group, esta curta metragem sobre o cuidado dedicado a uma mãe vítima de Alzheimer talvez configure uma boa oportunidade.

Marca: C.P. Group. Título: Gratitude. Agência: Ogilvy Bangkok. Tailândia, setembro 2018

Circuito de Generosidade

«Stultorum chorea». Dança dos tolos. (1550-1600), gravura de Frans Hogenberg (© British Museum).

No anúncio “Noel 2022”, da Coop, uma corrente de entreajuda forma uma roda: quem recebe um gesto de generosidade prossegue-o até regressar ao primeiro par, num encadeamento circular que lembra o circuito Kula das ilhas Trobriand (Bronislaw Malinowski). Bonito? Muito. Improvável? Bastante. Possível? Talvez, durante o Natal. Pelo menos, na imaginação. A roda da vida a sobrepor-se às danças da morte e dos tolos.

Dança macabra. Mosteiro dos Bernardinos. Séc. XVII. Cracóvia.

Marca: Coop. Título: Nöel 2022. Suíça, novembro 2022.

Anúncios de bolso

Com poucas imagens se ilustra muito. Publicidade vintage.

Anunciante: Bancos de alimento. Título: Palomas. Agência: McCann Erickson. Direção: Mario Garcia. Espanha 1999.

Para aceder ao segundo anúncio, carregar na imagem seguinte.

Anunciante: Journée Mondiale du Refus de la Misère. Título: Donnons la parlole aus pauvres. Agência: TBWA. França, 1998.

Comprar nada como investimento

McDonald’s Spain. The burger that could be. 2022

O anúncio The burger that could be, da McDonald ‘s Spain é um bom exemplo de um elevado sentido de oportunidade e da boa arte de a saber aproveitar. Trata-se de uma campanha que adota um estratagema que está a abrir caminho: convocar, ao mesmo tempo, o ecrã e a vida, interpelar tanto o espetador como o ator, numa mobilização em torno de uma causa emotiva emocionante e inclusiva emergente. Mais um caso de uma iniciativa de consciencialização interessada.

Marca: McDonald’s Spain. Título: The burger that could be. Agência: TBWA Spain. Espanha, agosto 2022.

As crianças na escola

O Principezinho

Contar histórias curtas é uma arte. Os anúncios Clean Conscience, da Usa, e Love Note, da Protection Environnement, constituem um bom exemplo. Duas pérolas do arquivo culturepub. Mas outros anúncios parecem requerer mais tempo como que para uma maior abertura ou massagem do espírito. É o caso do anúncio The Lunchbox, da Bufdir.

Marca: Usa. Título: Clean Conscience. Agência: Lowe. Tailândia, 2008.
Marca: Protection Environnement / Unilever. Título: Love Note. Agência: Price / mcnabb. Direção: Thom Higgins. Estados-Unidos, 1995.
Marca: Bufdir. Título: The Lunchbox (Fosterhjem.no). Agência: Kitchen Leo Burnett. Direção: Jens Lien. Noruega, 2017.

Anjos no purgatório: os cuidadores

Imagem extraída da página https://www.lusa.pt/article/KZWL5w4ocqE5TpC4ikpCwjMSZM5iuSI1/covid-19-miseric%C3%B3rdia-de-vila-real-com-13-casos-nos-cuidados-continuados-e-5-em-lar.

Oportuno, esperado e bem-vindo o anúncio One Crisis Has caused another, promovido pela britânica Frontline 19, com o selo de qualidade da agência Adam & Eve, de Londres. A pandemia do covid-19 exponenciou o protagonismo da figura do cuidador mas não a criou. O desafio do envelhecimento, dos idosos desprotegidos, não é menos grave e premente. É certo que a pandemia do covid-10 comporta uma dificuldade adicional: o desconhecimento e a imprevisibilidade. Agudizou, também, a consciência do problema.

Os cuidados, institucionais ou informais, dedicados à pandemia ou à velhice evidenciam-se sem comparação mais urgentes e exigentes do que os reivindicados por outras categorias, algumas parasitas, que ofuscam a comunicação social e colonizam o espaço público. Dispenso invocar exemplos.

A figura do cuidador existe desde que o homem é homem. Sem cuidadores, a sociedade esmigalha-se, colapsa. Mas resultam, paradoxalmente, votados a uma invisibilidade social e a um desamparo desconcertantes, num misto de letargia e vergonha coletivas. Abençoados os cerca de 1.4 milhões de portugueses (segundo inquérito da Associação Nacional de Cuidadores Informais, de 2020) que, informalmente, se esforçam e sacrificam pela qualidade de vida de familiares, amigos e vizinhos vulneráveis. Um gesto, uma palavra ou uma simples presença podem dar vida à vida. Cresce e perdura, lamentavelmente, o número de pessoas que sobrevivem e morrem desapoiadas, por vezes numa extrema solidão, entregues ao mal do século, a morte social. O cuidado dos enfermos e dos idosos, dos dependentes, oferece-se como uma medida da nossa insuficiência. Será tão mesquinha a nossa solidariedade e tão entorpecida a nossa preocupação? Oremos, senhor!

Anunciante: Frontline 19. Título: One Crisis has caused another. Agência: adam&eveDDB/London. Direção: NOVEMBA. Reino Unido, setembro 2021.

Aleijados

Oscilamos entre o gesto da compaixão, que sofre com o outro, e o olhar à distância que se deleita com ao espetáculo da miséria do mundo (inspirado em Hannah Arendt e Luc Boltanski).

Mendigo aleijado. Tóquio. 1965. Por Daido Moriyama.

Acorda devagar! Humano. Não te importes de perder tempo. Ganhas seiva e vida! O anúncio tailandês Beautiful Run é magnífico. Um épico do sofrimento e da solidariedade. Excessivo, lento e repetitivo. Diria, “maneirista”. Uma jovem inválida participa numa maratona para curar o pai. Não há maior competição do que aquela que mobiliza as pernas da alma.

A minha escrita foi-se tornando minimalista. Com a recente abstinência forçada, o vício agravou-se. Não escrevo textos. Escrevo esqueletos de palavras.

Marca: CP Group. Título: Beautiful Run. Agência: Ogilvy Thailand. Direção: Suwimol Suthanya. Tailândia, Julho 2021.

Testamento

Vanitas ‘Last will & Testament’- English school of the 17th century.

Primeiro anúncio: Se existem anúncios a agências funerárias (ver https://tendimag.com/2014/02/20/a-um-morto-nada-se-recusa/), por que não a associações de notários? A morte é um negócio que, pelos vistos, os cogumelos alimentam. Convém não esquecer o testamento.

Segundo anúncio: Velho Testamento; Novo Testamento; Testamento indeciso. “Se não não tem de quem goste, pense em nós”, contemple uma instituição de solidariedade social.

Anunciante: Chambre des Notaires de la Gironde. Título: Le Testament. Agência: Le Vestiaire. Direção: Antoine Lassort. França, novembro 2018.

Carregar na imagem seguinte para aceder ao anúncio.

Anunciante: Tcs – hospiz rennweg. Título: Anti-exclusion – Old Testament. Agência: Film Factory. Áustria, 2001.

O épico da agulheta

O risco e a incerteza predominam em tempos de coronavírus. “Mas na América mesmo quando a vida se torna difícil, nós nunca desistimos”. Existe a empresa Ace que, desde 1881, produz agulhetas (aglets) para os atacadores dos sapatos. Agulhetas minúsculas mas decisivas. Primeiro, o drama (o coronavírus), em seguida, o épico (a resiliência dos americanos); por último, a pregação: as agulhetas ajudam a apertar os laços, e a empresa Ace promove a solidariedade social. Um bom anúncio de salvação, esteticamente conseguido.

Marca: Ace Aglet Co. Título: Unraveled. Agência: MSA Creative. Estados Unidos, Maio 2020.