A Mãe e a Guerra
Hoje é Dia dos Pais no Brasil. Só não são todos os dias dias da mãe porque alguém se lembrou de decretar um dia especial. A relação com a mãe desdobra-se numa tensão entre união e separação, em que vibram as cordas tangíveis do coração: sensação, sentimento e emoção. Com a emigração e com a guerra colonial, exacerbou-se esta tensão. Multiplicaram-se os poemas e as canções. Poemas e canções que faziam chorar, perto e longe. Há pessoas que ainda agora se comovem ao ouvir estas músicas.
O Conjunto de Oliveira Muge, fundado nos anos cinquenta, é originário de Ovar, mas o essencial da sua carreira teve lugar em Moçambique. A canção Mãe, gravada em 1966 na África do Sul, alcançou um enorme sucesso: “O tema “A Mãe” foi das canções mais solicitadas pelos militares em Moçambique, no período da Guerra Colonial” (Conjunto de Oliveira Muge: http://guedelhudos.blogspot.com/2008/10/conjunto-de-oliveira-muge.html).
A Menina dos Olhos Tristes (1969), interpretada por José Afonso, dispensa apresentação.
Conjunto de Oliveira Muge. A Mãe. 1966.
José Afonso. Menina dos Olhos Tristes. 1969.
Os estrangeiros também têm mães. Algumas bastante complexas. Compõem, também, belíssimas canções. Retenho Mother, de John Lennon, interpretada ao vivo em 1972 no Madison Square Garden, bem como Mother (1979), dos Pink Floyd, numa interpretação dos Pearl Jam (2011?).
John Lennon. Mother. Ao vivo no Madison Square Garden. 1972.
Pearl Jam. Mother (cover dos Pink Floyd). 2011 (?).
Falta esta canção: https://www.youtube.com/watch?v=s3JiWHvaua4
A respeito da guerra colonial, muito coisa teria eu para dizer na minha qualidade de antigo combatente.
É claro que a figura da mãe estava sempre presente no espírito dos soldados. Mas eles raramente falvam nela, a não ser quando diziam, meio a sério, meio a brincar: «É para isto que uma mãe cria um filho». De resto, um homem de barba rija não se punha a chorar saudades da sua mãe diante de toda a gente; antes dizia piadas de caserna, quanto mais badalhocas melhor… Mas à noite, deitados na cama, todos eles terão vertido silenciosas lágrimas de saudade das suas mães.
Os programas de discos pedidos da rádio eram uma boa prova de que a mãe estava sempre presente no seu espírito. Em Moçambique, passavam o Conjunto de Oliveira Muge, com a sua canção que se refere concretamente às saudades da mãe sentidas por um combatente da guerra colonial, mas em Angola, onde eu estive e onde o Oliveira Muge não era conhecido, o programa “A Hora do Soldado” passava todos os dias (mas mesmo todos os dias) o “Amor de Mãe”, do brasileiro Teixeirinha, que é uma canção também ela bastamente lacrimogénia.
Olá, Fernando! Agradeço o seu comentário e o seu testemunho. Não conhecia a canção do Teixeirinha que, segundo a sua expressão, é bastamente lacrimogénia. A minha experiência militar é nula. Com 17 anos de idade, passei a fronteira a salto, por falta de autorização militar (ia estudar para França) e, quando já era professor na universidade há uns seis anos, tive que passar por uma espécie de tribunal militar no Porto. Mas ouço as pessoas. Algumas ainda agora falam com dificuldade desses tempos. Um abraço.