Search results for inferno

Apagar o inferno (reposto)

Warframe

Publicado em 17 de agosto de 2018.

Os trailers dos videojogos situam-se na vanguarda da estética e do imaginário contemporâneos. Chamam a si os maiores recursos e os melhores profissionais e criativos. No trailer We All Lift Together, do videojogo Warframe, criaturas, mistos de máquinas e seres humanos, surgem como guerreiros do trabalho, num estaleiro amplo, composto por partes metálicas e partes líquidas.

We All Lift Together. Warframe. Videojogo. Julho 2018.

Ouve-se um coro, um hino. Lembra as canções de resistência. Escolho quatro, uma por país eurolatino do sul: França, Le Chant des Partisans (Yves Montand); Itália, Bella Ciao (Yves Montand); Portugal, Grândola Vila Morena (José Afonso); e Espanha, Si Me Quieres Escrebir (Marina Rosell, a capella).

Chant des Partisans. Intérprete: Yves Montand. França. Resistência, II Guerra Mundial.

Bella Ciao. Intérprete: Yves Montand. Itália. Resistência, II Guerra Mundial.

Grândola Vila Morena. Intérprete: José Afonso. Portugal. Resistência ao fascismo.

Si me quieres escribir. Intérprete: Marina Rosell. Espanha. Resistência, Guerra Civil.

“Nada a temer” a “caminho do inferno”. Chris Rea

Pavimentado com tanto post o Tendências do Imaginário não deixa de estar cheio de buracos. Nenhuma menção, por exemplo, ao inglês Chris Rea [cerca de 25 álbuns publicados, desde 1978, sem contar as coletâneas]! Para o bom, nunca é tarde. Seguem as canções Nothing to Fear (1992), E (1999), E (1999) e The Road To Hell (1989).

Aproveito para convidar a ler o artigo “Quando a esmola é grande. A industrialização do interior”, que publiquei ontem, 20.03.2024, no jornal Diário do Minho. Está acessível no blogue Margens (https://margens.blog/2024/02/21/quando-a-esmola-e-grande-a-industrializacao-do-interior/).

Chris Rea – Nothing to Fear. Official Music Video. God’s Great Banana Skin. 1992
Chris Rea – E. The Road to Hell: Part 2. 1999
Chris Rea – The Road To Hell. The Road To Hell. 1989. Ultimate live version – 2006

À porta do inferno

Auguste Rodin. Pormenor da Porta do Inferno. 1880–1917.

Bruno Aveillan produz uma curta-metragem, Divino Inferno, dedicada à Porta do Inferno, de Auguste Rodin. Uma confluência de dois artistas do sobre-humano. Uma esteticização do sofrimento extremo e da resistência visceral. O desespero, a travessia arrepiada.

Seguem três vídeos. 1) Divino Inferno; e 2) Humans, ambos de Bruno Aveillan; e, para complemento, 3) Auguste Rodin – The Gates of Hell, um documentário do Canal Educatif à la Demande (CED).

Título: Divino Inferno [Rodin created the Gates of Hell ]. A film by Bruno Aveillan. Produced by Arte, National French Museum Guild (RMN), NOIR, Quad & Fix Studio. 2017.
Título: Humans. Directed by Bruno Aveillan. Edit by Thanh Long Bach. Music by Max Richter: Dona Nobis Pacem 2. 2019.
Auguste Rodin – The Gates of Hell. Canal Educatif à la Demande (CED). 2008.

Purgatório eterno

Eis o homem! Põe a culpa no sapato quando o culpado é o pé (Samuel Beckett. À espera de Godot. 1953).

Vou dedicar os próximos dias ao compositor polaco Zbigniew Preisner. Comecemos pelo céu (Ciel, Opéra Egyptien) para passar em seguida ao inferno (Enfer, La Double Vie de Véronique). Para assistir a um “purgatório eterno”, aconselho À Espera de Godot, de Samuel Beckett, em cena no Theatro Circo, quinta 15 e sexta 16, às 21:30. Entre as peças de teatro que mais me marcaram.

À Espera de Godot – um título que se tornou proverbial em todo o mundo. Talvez nenhuma outra peça do séc. XX tenha conhecido um alcance tão expressivo, tão global. É legítimo afirmar que, na noite em que estreou esta “tragicomédia em dois atos”, Samuel Beckett alterou por completo não apenas a literatura dramática, mas a própria condição teatral. Numa estrada, junto a uma árvore, duas criaturas sem eira nem beira, saídas de um vaudeville ou do cinema mudo, entretêm-se com jogos e picardias, rindo e chorando, discutindo tudo: um par de botas, os Evangelhos, o suicídio… Aguardam por alguém que não chega, que nunca chega: Godot, personagem-mistério que Beckett sempre se recusou a identificar com Deus, porque, mais do que aquilo que esperamos, lhe interessava realçar o que acontece enquanto esperamos (https://www.theatrocirco.com/pt/agendaebilheteira/programacultural/1332).

Zbigniew Preisner. Ciel Opéra Égyptien. Preisner’s Music. 1995
Zbigniew Preisner. Enfer (La Double Vie de Véronique, 1991). Preisner’s Music. 1995

Fogo

Hell by a follower of Hieronymus Bosch (c.1450-1516).

Fui ao inferno. Ainda cheiro a enxofre. Mas estou de volta. E apetece-me uivá-lo com os Polar Bear Club. Como quem vomita o fogo que consome as entranhas.

Polar Bear Club. Pawner. Clash Battle Guilt Pride. 2011.
Polar Bear Club. Killin’ It. Clash Battle Guilt Pride. 2011. Ao vivo em 2011.

Cristo ensimesmado. Recaída no vício das imagens

Imagem 1. Auguste Rodin. O Pensador.1880.Foto: Yuliia Fesyk

Como os castrejos, os emigrantes e os esquimós (ver Variações sazonais), também sou instável. Durante o longo e sombrio período do outono e do inverno, prevalece o meu lado acústico. Abandono-me aos prazeres da música. Com o despontar da luminosidade primaveril, torno-me mais vagabundo e visual. Tenta-me a gula das imagens, que procuro e devoro com deleite.

Imagem 2. Cristo pensativo. C. 1502. Wrocław. Madeira policromada. Museu Nacional de Varsóvia. Fonte: Radoslaw Mleczko

Com a Páscoa à porta, concentro-me nas imagens da Paixão de Cristo, em particular no episódio da via sacra em que, depois de ter carregado a cruz e enquanto os soldados romanos erguem a cruz, Cristo se senta a descansar. Consoante as regiões, assim é designado como Cristo “preocupado”, “pensativo”, “a descansar” ou “doloroso”.

Imagem 3. Cristo a descansar. Dreifaltigkeitskirche Görlitz. C. 1500

Estas imagens, sobretudo esculturas, distinguem-se pelo modo como evidenciam a vertente humana de Cristo. Mais frequentes na Europa do Norte, datam quase todas por volta do ano 1500.

Quando observo uma série de imagens, logo me acodem outras, associadas a outros contextos, por vezes, distantes. Neste caso, desafia-me a semelhança com o Pensador, de Auguste Rodin. Permaneci bastante tempo absorto pela comparação, mas sem ousar retirar qualquer conclusão.

Convém admitir que se trata de uma postura e de uma representação deveras humanas, profundamente humanas. A figura de Job (imagem 6 e 7) precede, na Bíblia, a de Cristo e o Pensador de Cernavoda (imagem 8), na história, a de Job.

Imagem 8. TheThinker of Cernavoda.Cc. 5000 B.C. Bucharest

O primeiro nome atribuído ao Pensador, de Auguste Rodin, foi O Poeta. Integra um conjunto escultórico de teor religioso, A Porta do Inferno (imagem 9), alusivo à Divina Comédia, de Dante (o dito poeta).

Convém convocar ainda mais três representações: por um lado, o Cristo em repouso, pintura de finais do século XV de Hans Holbein, o Velho (imagem 10); por outro, a estátua de Lourenço de Médici no seu túmulo (imagem 11) e a personagem na parte superior do inferno do Juízo Final, ambas obras de Michelangelo de meados do século XVI (imagens 11 e 12).

Cigarettes After Sex

Jean-Paul Belmondo

Fumar após o sexo tranformou-se numa espécie de contraordenação. Invocando o nome dos Cigarettes After Sex e convocando a campanha provocadora do IKEA, apetece-me brincar, alinhando combinações com as palavras “sexo” e “fumo”:
[Ontem] Sexo e fumo
[Hoje] Sexo sem fumo
[Amanhã] Nem sexo, nem fumo
[No inferno] Fumo sem sexo
Com 1,32 M de subscritores, i’m a cyborg but that’s ok edita canções dos Cigarretes After Sex acompanhando-as com cenas de filmes: Nothing’s Gonna Hurt You Baby, com Lost in Translation (2003); Affection, com Breathless (1960). Em ambos, sexo e fumo. No segundo, destaca-se Jean-Paul Belmondo, “l’acteur à la cigarrette par excellence”:

“Belmondo’s sexiness was connected – in a way that would now be problematic – to smoking. Stuck aggressively in his mouth, or insolently dangling, cigarettes emphasised his lips and made him look blasé and nonchalant – a look that a generation of young males would try to emulate”. (https://www.bfi.org.uk/news/jean-paul-belmondo-1933-2021).

Cigarettes After Sex – Nothings Gonna Hurt You Baby. I., 2012
Cigarettes After Sex – Affection. Affection, 2015

Embarque

Há precisamente um ano, na margem, o corpo à frente e a alma atrás, fui salvo por uma neurologista. Se estou neste mundo, devo-o a duas mulheres.

  • Diabo                À barca! À barca! andem já
  •                            que temos mansa maré!
  •                            Podem manobrar de ré!
  • Companheiro  Assim mesmo como está!
  • Diabo                Corre ali, seu Coisa-má
  •                            e acerta aquele atravanco
  •                            deixando livre esse banco
  •                            para a gente que virá
  •                            À barca! À barca! Seu nabo,
  •                            pois logo queremos ir!
  •                            Já é tempo de partir,
  •                            com louvores ao Diabo!
  •                            E puxa bem esse cabo,
  •                            põe logo o convés a jeito!
  • Companheiro  Será logo tudo feito!
  • (Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno, SWAI-SP editora, 2015)
Carl Orff. Carmina Burana. Reie. 1935-1936. Munich String and Percussion Orchestra. Madrigal Choir Munich. Conductor: Adel Shalaby.
Manuel de Falla. Siete canciones populares españolas. Nana. 1914. Violoncelo: Brinton Averil Smith. Piano: Evelyn Chen. Rice University’s Shepherd School of Music. 2011.

Alívio

Chove no inferno!

Schubert: Impromptu In G-Flat Major, D899, Op. 90 No. 3. Versão de Friedrich Guilda.

Prenda de Natal. As imagens também rezam

Les Très Riches Heures du Duc de Berry. Folio 158r. Missa de Natal

Durante a Baixa Idade Média, a experiência e o sentimento do religioso alteraram-se. Acentua-se a humanização do divino. O céu e o inferno aproximam-se da vida quotidiana. A relação com o sagrado intensifica o sensorial e o emocional. Implementa-se a oração no espaço privado. As imagens, utilizadas para a difusão da doutrina da Igreja, afirma-se, também, como mediação na comunicação com o Além. O prazer da imagem expande-se e diversifica-se. Este é o contexto em que aparecem e se multiplicam, a partir do séc. XIII, os livros de horas, suportes da oração em privado.  Dispendiosos, de fabrico demorado em oficinas especializadas, são inicialmente uma exclusividade da realeza, da alta nobreza e do alto clero. Prezados, símbolos de estatuto, preservados na esfera privada e motivo de colecionismo, sobreviveram à destruição que vitimou outros tipos de obras de arte. Só na Bibliothèque Nationale de France, na British Library e na Morgan’s Library, os exemplares contam-se aos milhares. Rica e minuciosamente ilustrados, sobressaem como fontes documentais do quotidiano e do imaginário medievais.

Jean de Vallois, Duque de Berry (1340-1416), colecionador “compulsivo” de obras de arte e “curiosidades” possuía vários livros de horas. Entre estes, os célebres Les Grandes Heures de Jean de Berry (1407-1409) e Les Très Riches Heures du Duc de Berry (1413-1416). É convidado a “folhear” o primeiro na galeria seguinte com a lista completa das páginas capitulares. No conjunto, o volume tem 126 folhas ilustradas (39,7 × 29,5 cm). O artigo Horae ad usum Parisiensem. Antecipação medieval do surrealismo acrescenta uma seleção das figuras fantásticas das margens do livro.

Galeria de imagens: Páginas capitulares do livro de horas Les Grandes Heures de Jean de Berry

Fonte: Bibliothèque Nationale de France: https://gallica.bnf.fr/

A descarga (download) integral de Les Grandes Heures de Jean de Berry (78.2 MB) está disponível no seguinte endereço (link): https://gallica.bnf.fr/ark:/12148/btv1b520004510/#

Se após a “leitura” das imagens das Grandes Horas de Jean de Berry sobrar algum tempo, pode ainda assistir ao concerto de música sacra espanhola (Llibre Vermell de Montserrat e Cantigas de Santa Maria), na catedral românica de Elne, durante o festival de radio France et Montpellier Languedoc-Roussillon 2013, com interpretação da Maîtrise de Radio France e Les Musiciens de Saint-Julien. Para aceder a este concerto, carregar na imagem seguinte ou no endereço https://margens.blog/2022/12/25/prenda-de-natal-os-anjos-tambem-cantam/, do blogue Margens. Aproveite a folga para perder tempo. Há quem preencha o vazio a fazer posts. Não é exemplo. É vício.

Blogue Margens: https://margens.blog/

De criação recente, cozido no mesmo forno, o blogue margens é parceiro do Tendências do Imaginário. Embora com vocações e composições diferentes, apostam na simbiose e na complementaridade, sem inibição de mútua remissão. O custo desta dança resume-se a um clique.